A pandemia do novo coronavírus tem mudado vários hábitos das pessoas, inclusive a maneira como elas consultam com médicos. Para evitar aglomerações em hospitais e centros de saúde durante a pandemia, o Senado aprovou o projeto de lei que autoriza o uso da telemedicina no Brasil em quaisquer atividades da área de saúde. Em ofício enviado ao Ministério da Saúde, o Conselho Federal de Medicina (CFM) já havia autorizado o uso dessa modalidade de atendimento no país.
A presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de Minas Gerais (CRM-MG), Cláudia Navarro, explica que a telemedicina é regulamentada desde 2002 pela Resolução 1.643 do CFM, com o objetivo de assistência, educação e pesquisa em saúde. “Agora, frente à pandemia da COVID-19, que é efetivamente combatida pelo isolamento social, e dada à necessidade de proteger a saúde dos médicos e pacientes; o CFM decidiu acolher a portaria 467/2020, do Ministério da Saúde, que prevê o uso da telemedicina em situação de excepcionalidade e enquanto durar o surto dessa doença”.
A médica diz que as consultas on-line, assim como as presenciais, devem obedecer aos preceitos éticos da medicina. “Esse atendimento devem ser, obrigatoriamente, registrado em prontuário clínico e os médicos também estão autorizados a emitir atestados ou receitas desde que assinem os documentos eletronicamente”.
Apesar de ainda estar sendo testada, não haverá fiscalização ativa do CRM nesta modalidade. Entretanto, o conselho garante que irá investigar qualquer denúncia formal de possíveis ilícitos éticos durante a prática de telemedicina. “Neste momento queremos atingir o objetivo primário, que é manter o isolamento social, imprescindível para a contenção da pandemia”.
Sobre o valor das consultas, Cláudia diz que essa é uma decisão dos profissionais. “Pacientes particulares negociarão o preço do atendimento diretamente com o médico e pacientes do sistema público receberão de maneira gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Não houve ainda uma definição de preços para a saúde suplementar”.
Para o futuro, a presidente acredita que é possível que a telemedicina seja mantida, porém, provavelmente, sob uma nova regulamentação do CFM. “O principal ponto é a distância imposta à relação médico-paciente. A proximidade fortalece o vínculo entre os dois, repercutindo na qualidade e aderência ao tratamento. Outro ponto é a impossibilidade da realização de exame físico do paciente, que pode ser fundamental para o diagnóstico das patologias”.
Telemedicina na prática
A reumatologista Flávia Nascimento é uma das profissionais que está usando a telemedicina para atender os seus pacientes. Ela conta que começou às consultas no último dia 30. “Acredito que a maior vantagem dessa modalidade é poder levar acolhimento e acompanhamento para meu paciente neste momento de incertezas. Isso traz conforto e tranquilidade para o perfil dos pacientes que atendo, pois a maioria é de portadores de doenças crônicas e do grupo de risco para a COVID-19. Já a desvantagem que percebi foi a pouca familiaridade de algumas pessoas com a tecnologia. Inicialmente, elas se sentem um pouco desconfortáveis e inseguras, mas logo conseguimos contornar e a consulta flui. Para mim, que gosto do contato do paciente, o que senti falta foi realmente o abraço ao fim da consulta”.
A médica diz que, até o momento, considera praticamente igual para os pacientes que já acompanha há um tempo, porém, nas especialidades que necessitam de um exame físico minucioso, ela não aconselharia atendimento de primeiros pacientes somente por telemonitoramento. “Espero que a telemedicina continue, afinal isso foi um grande salto para nós médicos e para os pacientes que têm dificuldade de irem ao consultório, como aqueles que moram em outras cidades ou têm dificuldade de locomoção, por exemplo”.
A personal organizer Denise Pezzini também tem boas experiências com o atendimento on-line. Ela relata que procurou por esse serviço no dia 1º de abril após sentir alguns sintomas semelhantes aos de uma gripe. “Como estamos sendo informados diariamente para não procurarmos o pronto-atendimento por qualquer coisa, resolvi ligar para o meu plano de saúde e fui orientada a procurar esse auxílio remoto. O médico que me atendeu foi extremamente cuidadoso e não senti falta de estar com ele presencialmente. Além disso, durante 3 dias, ele me ligou para saber como eu estava e se aquela gripe já havia passado. O lado negativo disso é que, no meu desespero, esqueci de perguntar o nome do profissional que me atendeu”, finaliza.
Números
A telemedicina já é realidade em vários países. Segundo dados da Babylon Health, uma das empresas mais avançadas da Europa nessa modalidade, na Inglaterra, mais de 40 mil pessoas já fazem atendimento médico on-line e a demanda por esses serviços é tão grande que a companhia já expandiu suas operações para o Canadá, China e Ruanda. Só no país africano foram realizadas mais de 1 milhão de consultas digitais. Outras plataformas, como Baidu Inc., atendem, apenas no país asiático, cerca de 850 mil consultas gratuitas diariamente.
No Brasil, a Doctoralia, na primeira semana, após a liberação do atendimento on-line, agendou 5.170 consultas e, na semana seguinte, o número passou para 8.855, alta de 71%. Na GSC Integradora de Saúde, mais de 3 mil médicos se cadastraram em apenas 48 horas e a rede de clínicas populares Dr.Consulta agendou mais de 2 mil consultas. Já a iClinic, startup especializada em desenvolvimento de tecnologia para clínicas médicas e que acaba de lançar uma plataforma de telemedicina, conta com mais de 8.700 usuários em apenas uma semana.