As votações no microfone, como foi o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e a negativa da Câmara para o processo por corrupção contra o presidente Michel Temer (PMDB), mostram a cara da representação do povo brasileiro. É assustador. Até profissionais iniciados, que fazem a cobertura da política ficam de olhos arregalados. Brotam deputados que ninguém nunca ouviu falar. Aparecem jeitos e personalidades que denunciam o divórcio efetivo entre o que pensa e o que quer o povo e o que faz o seu representante na Câmara e Senado. As excelências estão mesmo descontroladas.
Acho um evento tão importante que já defendo o fim do voto na digital e código e o painel moderno do plenário que custou mais de US$ 4 milhões. Acho que todo voto deveria ser assim, na cara, na lata e ao microfone. Um festival de cretinice e de besteiras, porém, transparente. Não faltam ignorâncias, populismo e surpreenda, seriedade. É assim a formação do nosso parlamento. Discordo de cientistas políticos que dizem que este é o retrato do Brasil. Não é. Irrita pensar que o eleitor não sabe votar. Não é verdade. O eleitor sabe e muito bem votar, mas admito que a boa fé dele seja ludibriada. A cara do povo brasileiro é honesta a do Congresso é desonesta. Isso é o que parece.
No desfile dos tatuados, dos que mandam votos para mulheres e dos que fogem do plenário o desenho que vejo é o jogo de interesse. Os deputados estão sendo monitorados. Todos têm controle remoto nas mãos de pessoas que não estão no plenário. Hoje, ficou mais fácil comprar dois ou dez deputados do que se submeter a uma chatice de eleição, gastar dinheiro e tempo para entrar num clube que já não tem mais boa reputação. Se você pode ter votos em plenário é o que manda. O resto é ônus e custo pessoal. A política está terceirizada há muito tempo.
Um vai votar enrolado na bandeira do Brasil, fala em honestidade da família e o pai é preso na semana seguinte por corrupção e aparece vestido aquele vergonhoso macacão laranja que ficou famoso no goleiro Bruno. Outra oferece o voto ao marido que é preso em seguida. Outro é o voto definitivo e comemora como se fosse a final de um campeonato e na manhã seguinte assume um ministério e já está sendo investigado na Lava Jato. A política está mesmo em declínio.
Um prato cheio para o aparecimento de monstros. Para político, monstro é tudo aquilo que não é espelho. Eles podem mesmo dominar as próximas eleições e no dia seguinte serão de novo políticos. A coisa entra de novo no eixo. Fica difícil de fugir do padrão. Só que em cada gabinete por aqui mora uma instituição. Qualquer deputado daqueles que aparecem nos votos de microfone tem a sua base, a sua vida, o seu apoio e os seus desafetos. Muitos e muitos. Deputados representam igrejas, instituições sociais, clubes de futebol, bancos, empreiteiras, a saúde (donos de hospitais particulares), agropecuária, direitos humanos, indústria de armas e, até, o povo, esses são os imprescindíveis. Portanto, todo deputado tem um controle remoto e o debate é sobre quem manipula este poderoso instrumento.