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“Mais de 100 milhões de processos estão parados no país”

Já parou para pensar como funciona a Justiça no país? Atualmente, todos os olhos estão voltados para os grandes casos de corrupção que assombram o Brasil. A cada movimentação do processo da Lava Jato, entre outros escândalos no meio político, a população se surpreende e, também, repercute a cada nova informação. Contudo, diante de acontecimentos que demandam uma atenção redobrada da Justiça, hoje, mais de 100 milhões de processos estão parados em todo o território nacional, segundo o advogado Getúlio Barbosa de Queiroz.

Para entender mais sobre os trâmites jurídicos, o Edição do Brasil conversou com Queiroz, que tem mais de 55 anos de experiência na área do direito. Com um currículo extenso, ele também foi funcionário da Justiça, oficial de gabinete, chefe de gabinete do professor Paulo Neves de Carvalho e juiz substituto do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG).

Explique como funciona a Justiça no país.
O funcionamento é por meio de um advogado que representa a parte (pessoa física ou jurídica), onde se formula os pedidos em juízo e estes desenvolvem o processo até a decisão. Dentro da decisão, confere o direito da parte, sendo positivo ou negativo.

Em relação ao regimento de custos dos tribunais, eles estabelecem os valores de custas prévias (despesas) para você entrar na Justiça. Existem aqueles que, por norma constitucional e lei específica, são necessitados de assistência judiciária, ou seja, na própria petição é requerida a assistência, comprovando que a pessoa é hipossuficiente de recursos para arcar com os gastos do processo. Vale lembrar que isso não interfere no andamento dele, os casos são tratados igualmente.

Mas, o poder Judiciário no Brasil está institucionalizado há mais de 250 anos. Podemos dizer que a instituição está muito insipiente, ela não tem uma estrutura de poder que se desenvolve à altura das necessidades da prestação de serviços jurisdicionais.

Os casos de grande repercussão atrapalham o andamento dos demais?
A nossa Justiça está polarizada entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e o juiz Sérgio Moro, no Paraná. Isso por causa de certos desacertos por parte dos ministros do Supremo que, atualmente, julgam por vaidades pessoais, o que tem trazido problemas no desenvolvimento do poder Judiciário. Mesmo porque cada um entende de um jeito, não há uniformidade. Por outro lado, tem o Moro que está incumbido da Lava Jato – onde todos os processos que envolvem a corrupção de maneira geral foram centralizados. Assim, isso nos dá a impressão que a Justiça está funcionando, mas na verdade não está, pois são apenas processos penais. Eles estão canalizando muita mídia nesses casos, quando mais de 100 milhões de processos estão paralisados nos auditórios forenses do Brasil. E isso tem causado um mal estar, a ponto de dizer que o cidadão brasileiro não acredita mais na Justiça. Não quero criticar ninguém, mas aponto que essa estrutura está mal feita.

O crime tem muito espaço na mídia – mas tão importante quanto os casos que estão com o Moro, são os outros 110 milhões em andamento, pois o direito está ali e está reclamando que se decidam sobre ele, pois todos tem a mesma importância. É preciso um tratamento igualitário.

Por que alguns casos são morosos? Quais são os principais problemas da Justiça brasileira?
A estrutura está muito deficiente. A responsabilidade disso quanto ao poder Judiciário é da magistratura nacional. As distorções dentro do poder precisam ser minimizadas e eliminadas. O juiz não pode acumular a função de judicante com o exercício da função administrativa, por se tratar de funções incompatíveis. Isso é o emperramento da máquina. E ainda tem um agravante que são os assessores, eles tem o cargo e não tem a função, pois não assinam nada que faz, e isso ocorre em todos os órgãos do poder Judiciário do país. Para se ter ideia, um ministro do Supremo deve ter em torno de 5 ou 6 assessores, aqui cada desembargador tem 3 ou 4 assessores e um juiz tem cerca de 2.

Outro problema são as férias e recessos forenses dos magistrados que atrapalham as pautas de julgamentos. Nada foi feito para suprir essa lacuna. Os magistrados têm as férias regulamentares, de modo que os julgamentos não são realizados quando estão ausentes. Isso é uma distorção do sistema. Essa ausência de controle provoca o retardamento da prestação jurisdicional.

É correto dizer que a Justiça do Trabalho é mais eficiente no país?
A Justiça do Trabalho só tem uma matéria de discussão e de realização do direito, o direito do trabalho. Com isso, eles conseguiram por meio do sindicalismo no Brasil, complementar a consolidação das leis do trabalho, seja a favor da classe empresarial ou trabalhadora. Eu até sugeri certa vez que, devido a essa reforma trabalhista, deveria se fazer uma fusão no direito do trabalho com a Justiça Federal, pois ambas são federais e discutem o mesmo problema. Isso reduzia em 100% a economia do país na matéria do Judiciário.

Como os processos podem ser tratados com mais agilidade?
Hoje, a magistratura só se preocupa com os seus vencimentos pessoais, e tem se descuidado da função judicante e de distribuir justiça. Nós estamos passando por uma crise acentuada, pois o que se institui atualmente no Judiciário são meras falácias de realização do direito. Os atos realizados pelas direções dos tribunais não passam de engodo. Um exemplo é o funcionamento de uma central de cumprimento de sentenças, chamada Centrase, em que todos os processos cíveis, a partir de 2016, começaram a ser remetidos a essa central. Ela não tem condições de dar os impulsos processuais que são necessários. Isso é um atraso nos processos. Como esses processos vão ter andamento? E posso dizer que não há excesso de trabalho, pois tem juízes que estão com o serviço em dia. Contudo, é preciso reestruturar o poder Judiciário. Para se ter uma estrutura consistente é preciso seguir a dinâmica da sociedade.