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Baixo estoque nos bancos de leite afeta o tratamento de bebês

Maternidade Odete Valadares precisa de 250 litros de leite por mês, mas encerrou abril com apenas 186 litros | 10 Renato Cobucci

“A Emilly nasceu com 34 semanas e ficou internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal por quase 20 dias. Eu não conseguia amamentar minha filha e precisei receber doação de leite materno”, relata a operadora de caixa, Jennifer Braga. Assim como ela, milhares de outros bebês nascidos prematuros também necessitam dessa ajuda para terem um crescimento e desenvolvimento saudável, além de ficarem protegidos contra doenças. Porém, o número de doadoras não tem sido suficiente para manter os estoques em níveis adequados e atender integralmente à demanda.

Jennifer conta que sua filha mamava 2ml a cada 3 horas. “Qualquer sinal de recuperação era uma vitória imensa para nós. A mãe que doa um pouco do seu leite pratica um ato de amor que não tem preço. Eu tenho um enorme agradecimento às doadoras que ajudaram no momento mais importante do desenvolvimento da minha pequena”.

Em Minas Gerais, o Banco de Leite Humano (BLH) da Maternidade Odete Valadares (MOV) é a referência, responsável por capacitar e dar assessoria técnica aos demais bancos e postos de coleta do estado. De janeiro a abril deste ano, chegaram às geladeiras da unidade 708 litros, o que representa uma média de 177 litros por mês. Apenas em abril foram coletados 186 litros, quantidade 25% abaixo dos 250 litros mensais, considerado ideal para o número de usuários do serviço.

De acordo com a coordenadora do BLH da MOV, Maria Hercília Barbosa, os bancos de leite no Brasil estão com os estoques abaixo do esperado. “Na Odete Valadares atendemos 140 nascidos prematuros por mês, não apenas da unidade, como também de maternidades parceiras. Com os níveis insuficientes, deixamos de ajudar alguns bebês maiores que poderiam estar recebendo exclusivamente leite humano pasteurizado. É necessário renovar constantemente o quadro de doadoras. A maioria das mulheres retornaram ao trabalho e a dupla jornada, muitas vezes, dificulta a doação”, afirma.

O Brasil é referência internacional por utilizar estratégias de baixo custo e alta tecnologia, além de ser dono da maior e mais complexa rede de BLHs do mundo, com mais de 400 unidades no país. “Minas Gerais possui 853 municípios, contando com 12 bancos e 30 postos de coleta. Se houvesse mais unidades espalhadas pelo estado, talvez seria possível aumentar a quantidade de doações e atender uma demanda ainda maior”, destaca.

Importância para prematuros

Conforme dados do Ministério da Saúde, todo ano nascem cerca de 340 mil prematuros ou com baixo peso no Brasil, ou seja, bebês que chegam com menos de 37 semanas de gestação. O número representa aproximadamente 11% do total de nascimentos. No ranking mundial, o país ocupa a 10ª posição. O leite materno é um dos fortes aliados no combate à mortalidade infantil. Em relação ao ano 2000, a taxa caiu praticamente pela metade no país. De 26 óbitos a cada mil nascidos para 13 por mil em 2019.

Segundo a pediatra Priscila Martins, a recomendação é que os bebês recebam, exclusivamente, leite materno durante os primeiros 6 meses de vida. “Também de forma complementar até os 2 anos. Ele é o melhor e o mais completo alimento para a criança. Doar leite materno é importante para os recém-nascidos, principalmente, para aqueles que estão internados e não podem ser amamentados pela própria mãe”.

Ela acrescenta que o leite materno possui células de defesa importantes para a saúde do bebê, sobretudo os que nasceram prematuros. “Ele contém substâncias essenciais para prevenir a verminose, problemas respiratórios, doenças de pele, inflamação de ouvido, dentre outras. Dependendo do peso, apenas 1 ml por mamada já é o suficiente para nutri-lo”.

Gesto que salva vidas

A psicóloga Márcia Gomes produzia leite em quantidades mais que suficientes e resolveu ser uma doadora. “Eu já tinha consciência da importância do leite materno durante os 6 primeiros meses de vida da criança. Na minha segunda gravidez, como eu dava muito leite e meu bebê não conseguia mamar tudo, decidi doar o que sobrava para ajudar outras mães”.

Ela afirma que praticar esse ato é maravilhoso. “Você não está apenas doando leite, você está salvando vidas. Muitas mulheres têm medo de doar com medo do leite acabar, mas posso afirmar por experiência própria que quanto mais estimular o peito a produzir leite, mais você o terá”.

Quem pode ser doadora?

Maria Hercília explica que qualquer mulher que esteja amamentando e produza um volume de leite que exceda a necessidade de seu filho pode ser uma doadora. “A mãe precisa ser saudável, não tomar medicamentos que interfiram na amamentação, não fumar ou beber, não ter tido hepatite ou ter feito transfusão de sangue nos últimos 12 meses”, explica.

Ela diz ainda que aquelas que contraíram a COVID-19 e já tenham se recuperado, passado o período de isolamento de 15 dias, podem doar o leite sem problemas. “As vacinadas contra a doença também podem ser doadoras. Qualquer quantidade doada é importante. Cada litro de leite materno alimenta 10 bebês prematuros”, finaliza.