O crescente uso de dispositivos digitais tem transformado o cotidiano dos cidadãos. De acordo com o Relatório Global de Visão Geral Digital, o Brasil é o segundo, entre 45 nações do mundo avaliadas, em que as pessoas passam mais tempo em frente às telas. São, em média, 9 horas e 32 minutos por dia, considerando também computadores.
Além disso, a Pesquisa do Uso de TI feita pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostrou que o Brasil tem hoje 258 milhões de smartphones habilitados. O número é o maior da história e representa, em média, 1,2 aparelho para cada habitante do país. “Com a popularização dos celulares com internet, computadores e televisores, a dependência dessas tecnologias tem se tornado uma preocupação significativa para a saúde mental e física da população”, afirma a psicóloga Lara Fagundes.
Ela diz que a pandemia de COVID-19 acelerou essa tendência, com muitos brasileiros passando um tempo maior em casa e, consequentemente, mais tempo conectados. “A transição para o trabalho remoto e o aumento do uso de plataformas de streaming e redes sociais intensificaram o vício em telas. Plataformas como Facebook, Instagram e TikTok são projetadas para serem envolventes e viciantes, com algoritmos que estimulam a interação contínua, e a abundância de conteúdo disponível e a possibilidade de acesso instantâneo a notícias e entretenimento contribuem para o aumento do tempo gasto em telas”.
Além das consequências físicas, como dores nas costas, mãos e pescoço, sedentarismo e obesidade, Lara ressalta que a prática também é muito prejudicial para a mente. “O uso prolongado de telas, especialmente redes sociais, tem sido associado a níveis mais elevados de ansiedade e depressão. A comparação constante com outros e a exposição a notícias negativas podem impactar o bem-estar emocional”.
“A exposição à luz azul dos dispositivos digitais, sobretudo antes de dormir, interfere na produção de melatonina, o hormônio do sono. Isso pode levar a dificuldades para adormecer e a um sono de má qualidade. Embora as redes sociais possam conectar as pessoas, o uso excessivo pode levar ao isolamento social. A interação face a face é substituída por comunicação digital, reduzindo a qualidade das relações pessoais”, completa.
Vício
A estudante Ana Cristina, de 16 anos, conta que está fazendo acompanhamento para tratar o vício em celular. “Eu checava o aparelho constantemente, mesmo durante as aulas e as refeições. As notificações se tornaram a coisa mais importante para mim. Era como se precisasse estar sempre conectada para não perder nada. Ficava acordada até tarde, rolando o feed do Instagram e assistindo a vídeos no YouTube. Como resultado, estava sempre cansada e com dificuldades para acordar cedo e prestar atenção na escola. Vi que precisava de ajuda quando comecei a ter crises de ansiedade e estresse”.
A psicóloga explica que em crianças e adolescentes, os prejuízos podem ser ainda mais graves. “Redes sociais e aplicativos de mensagens expõem a comparações constantes com seus pares, o que pode gerar sentimentos de inadequação, ansiedade e depressão. A busca por validação através de ‘curtidas’ e comentários pode afetar negativamente a autoestima, além da exposição a comportamentos agressivos on-line, como o cyberbullying, pode ter um impacto devastador na saúde mental dos jovens, levando a sentimentos de isolamento e sofrimento emocional”.
“Criar regras claras sobre o uso do celular, como horários específicos e limites diários, encorajar atividades fora das telas, como esportes, leitura e interações sociais e educar crianças e adolescentes sobre os impactos do uso excessivo de celulares pode ajudar a reduzir o tempo excessivo gasto em dispositivos digitais”, conclui.