Dados da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP, na sigla em espanhol), apontam o Brasil como um dos países que mais teve retrocesso na liberdade de imprensa do mundo. De um modo geral, porém, a análise registrou uma melhoria de 4,2 pontos na média dos 22 países avaliados no continente. Em 2021, a média do indicador atingiu 55,6 pontos, contra 51,4 no ano anterior, numa escala de 0 a 100.
Porém, o Brasil não seguiu a média. Ficando atrás apenas da Argentina e do México, o país perdeu 5,6 pontos no índice, mas manteve a 19ª colocação no ranking, à frente da Venezuela, Cuba e Nicarágua. Segundo a SIP, o maior e mais populoso país da América Latina passa por um processo histórico de enfraquecimento das instituições democráticas, nas quais se incluem os meios de comunicação, que se acelerou a partir das eleições de 2018.
No dia 3 de maio é celebrado o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. E, uma vez ameaçada, quais os perigos podem surgir para uma nação? Para falar a respeito, o Edição do Brasil conversou com a Alessandra Mello, repórter e presidenta do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG).
O que é liberdade de imprensa? Qual a sua relevância?
Trata-se da possibilidade de dar às pessoas o acesso à informação, que é feito por meio dos meios de comunicação de massa. Esse contato entre população e informação, deve ser feito sem a interferência do poder político ou econômico. A liberdade de imprensa é um marcador da democracia. Quanto mais livres os meios de comunicação, mais democrática é a nação.
Qual o papel de uma imprensa livre?
É ser a porta-voz de grupos invisíveis em nossa sociedade. É também ter a possibilidade de mostrar as mazelas existentes em nosso país e revelar o que os poderosos querem que fique oculto. Esse é o papel da imprensa, o de denunciar, criticar e expor o que, muitas vezes, as pessoas não querem que seja exposto.
O Brasil está entre os países com maior retrocesso na liberdade de imprensa. A que você atribui isso?
O Brasil cai mais a cada dia no ranking da liberdade de imprensa do mundo. Um dos principais fatores para isso é a violência contra jornalistas e comunicadores, que cresce no país, sem que nenhuma autoridade faça nada. Por aqui, a mídia é muito concentrada, ou seja, está nas mãos de um grupo seleto: 9 famílias dominam a comunicação no Brasil. Isso também é algo que impede uma imprensa mais livre e democrática. Mas a nossa queda é mesmo causada nos últimos tempos pela violência assustadora contra jornalistas.
Quais os perigos desse retrocesso?
O ataque à liberdade de imprensa é também um ataque à liberdade de expressão. Esse é um dos princípios da nossa Constituição. Obviamente é bom lembrar que a liberdade de expressão não é absoluta, se não as pessoas vão usar desse argumento para propagar discurso de ódio, preconceito e violência. Tem um limite. Mas esse retrocesso é muito ruim. Deixa a gente mais vulnerável. Não ter uma imprensa livre, que possa reportar o que está acontecendo, sem nenhuma influência do poder político e econômico, é sinal de que nossa democracia está abalada. Isso torna o país menos livre.
Existe uma desvalorização da imprensa no país?
Sim. Foi feito um trabalho exitoso de descredibilizar a imprensa. Contudo, acredito que a pandemia melhorou um pouco isso, pois foi nessa hora que as pessoas compreenderam a relevância do nosso papel. Isso aumentou a credibilidade, uma vez que foi necessário o auxílio dos meios de comunicação para que a população compreendesse o que estava acontecendo.
A desvalorização da imprensa é algo orquestrado por pessoas que não aceitam o contraditório, a democracia e acreditam que podem fazer o que quiserem, achando que não serão contestados pelos meios de comunicação. Pois vão. E aí se rebelam, se revoltam e estimulam o ódio contra a imprensa. Atualmente, um dos maiores agressores da imprensa é o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Como isso poderia ser melhorado? De que maneira a imprensa pode voltar a ser valorizada?
Um passo inicial é coibir a violência contra jornalistas e os meios de comunicação em geral. As autoridades brasileiras estão devendo, não só a nós, jornalistas, mas a sociedade como um todo. É preciso que se tome providências, que haja investigação e punição, a fim de que doa no bolso dos responsáveis pelos ataques.
Falo também como sindicalista. É preciso considerar o profissional jornalista, dar a ele mais condições de trabalho, salários melhores, regularização do diploma e uma valorização que condiga com a importância do trabalho prestado para a sociedade. Todas as profissões têm sua relevância, mas algumas têm a possibilidade de mudar os rumos do país. E a imprensa é uma delas. Precisamos avançar nesse quesito, contudo, estamos em um momento no qual falar sobre isso não é bom, haja visto que temos um presidente contrário à imprensa, um Congresso Nacional aliado a ele, conservador e, também, contrário ao jornalista. Mas é um assunto que precisamos discutir e olhar com muito cuidado na próxima legislatura.