O isolamento social imposto pela pandemia de COVID-19 afetou a rotina de todos. Com mais tempo em casa, crianças e adolescentes buscam na internet uma forma de passatempo. E justamente por estarem mais vulneráveis que o risco de se tornarem vítimas de pedófilos, que atuam na rede, aumenta. Muitos pais ou responsáveis também não costumam checar o que seus filhos estão acessando no mundo virtual. Sobre este tema, o Edição do Brasil conversou Fernanda Teles, psicóloga e especialista em parentalidade positiva e consciente.
O que é pedofilia na internet?
É quando os pedófilos usam redes sociais, e-mail, salas de bate-papo para assediar crianças e adolescentes abaixo de 18 anos. Eles também podem publicar, reproduzir, armazenar, inclusive, vender fotos e vídeos com pornografia infantil. Fazem uso da internet para aliciar menores com a finalidade de realizar atividades sexuais ou para que a vítima se exponha virtualmente.
Por que isso é tão preocupante?
Os pequenos estão passando mais tempo na rede neste período de isolamento e, assim, se tornam uma presa muito fácil, pois não têm maturidade para compreender a situação, principalmente quando falta diálogo em casa. Eles não sabem distinguir uma aproximação segura de uma com más intenções. Às vezes, a criança nem percebe e acha que aquilo é natural, enquanto o pedófilo está fotografando ou gravando. É um campo facilitador para o criminoso agir, pois ninguém está o vendo e pode fazer uso de perfis falsos. Os pais devem ficar atentos ao que os filhos estão acessando.
Existe um perfil do pedófilo que age na internet?
Na minha experiência e com as mínimas informações disponíveis, quem comete esses delitos, geralmente, são homens de 30 a 45 anos, solteiros e que moram sozinhos, têm alterações de alguns hormônios e antecedentes de abusos sexuais na infância. Mas tudo isso ainda é insuficiente para traçar um perfil. Esse é um assunto novo e com poucos estudos, mas é sabido que oito em cada 10 pedófilos são alguém de confiança da família.
Eu já acompanhei uma mãe que desconfiava de que seu próprio pai e avô da filha estava fotografando a jovem. O fato foi descoberto quando o criminoso enviou sem querer a imagem em um grupo no WhatsApp. Muitas vezes, os parentes não quererem denunciar por ser uma pessoa de convívio próximo e abafam o caso. Por fazerem isso e não buscarem ajuda, os dados sobre pedofilia na internet são escassos.
Quais comportamentos podem indicar um possível abuso?
Normalmente, são mudanças de comportamentos abruptas. De um dia para outro, os responsáveis podem notar que a criança está mais agressiva, com medo, dificuldade para dormir e tensão. Essas são as principais características que podem evidenciar um abuso, mas tudo tem que ser avaliado. Já no mundo virtual, não tem um aspecto específico. Hoje, os adolescentes estão viciados na tecnologia e não podemos afirmar que aqueles que passam muito tempo na internet sejam casos de pedofilia. É necessário verificar cada situação individualmente.
Quais cuidados os pais precisam ter com os filhos?
Quando estamos falando de uma criança, os pais devem controlar o que estão acessando e colocar limites, seja no videogame, celular, computador ou qualquer outro dispositivo eletrônico. Tudo deve ser feito sempre com a supervisão de um adulto e por um tempo estipulado. Procure assistir aos conteúdos com seus filhos, mesmo que seja de classificação indicativa livre. Os adolescentes têm mais dificuldades de aceitar quando os responsáveis usam essa estratégia de vigiar tudo o que fazem. Nesse caso, o mais importante é desenvolver uma relação de segurança, confiança e respeito mútuo com eles.
Qual a importância do diálogo familiar para evitar esse transtorno?
É preciso tomar cuidado com o espaço vazio emocional que é gerado na criança por conta de pais extremamente autoritários. Quando não existe uma segurança, espaço de fala, ambiente onde o menor possa conversar sobre suas emoções, acaba criando margem para o crime acontecer. O diálogo é fundamental na família, assim como ensinar os pilares para prevenção do abuso, respeitar e valorizar o próprio corpo. A partir dos 4 e 5 anos, falar com o pequeno que somente ele pode tocar em suas partes íntimas.
Como agir com uma criança ou adolescente quando contam que foram abusados?
Quando chegam a falar que estão sendo abusados já é um grande passo, pois muitos ficam encurralados e não contam. É muito importante denunciar o agressor, mesmo que seja um parente próximo. A criança ou adolescente é encaminhada para um tratamento terapêutico urgente para evitar possíveis transtornos graves na vida adulta.
Há algum país que seja exemplo e poderia ser aplicado no Brasil?
A pedofilia é considerada uma parafilia, ou seja, um transtorno da preferência sexual. Nem sempre um pedófilo vai cometer o ato com a criança. No entanto, essas pessoas têm um problema e precisam de um acompanhamento médico. Não existem políticas públicas nem um sistema de saúde para acolher e oferecer o tratamento. Na Alemanha e no Canadá existem campanhas chamando os indivíduos que sofrem disso a buscar ajuda. No Brasil, não se fala no assunto e, muitas vezes, a pessoa pode ser linchada ou morta na cadeia.