Escrito por Jader Viana*
Com alguns meses de atraso, um eminente grupo com mais de 500 economistas, banqueiros e empresários publicou carta aberta, nesta semana, com duras críticas ao governo federal no combate à pandemia do coronavírus. Mais do que criticar a falta de coordenação e planejamento na crise sanitária, os signatários apontaram o iminente desastre econômico e social no Brasil em função da inércia do Planalto. Entre os missivistas, estão ex-ministros, ex-presidentes do Banco Central e sócios dos principais bancos brasileiros. Trata-se da fina nata dos Faria Limers, como são jocosamente chamados àqueles que frequentam a região da Faria Lima, em São Paulo, na área que concentra escritórios dos maiores bancos e empresas no Brasil.
Sem citar o nome de Jair Bolsonaro e de seu ministro Paulo Guedes, o grupo afirma posições que vão à contramão do que tem apregoado o presidente, tais como a necessidade urgente de uma vacinação em massa, o apoio do governo central às medidas de isolamento e o incentivo ao uso de máscaras. Alertam, ainda, que é falso o dilema entre a vida e a manutenção dos empregos. Citando diversas pesquisas, disseram que a economia se comportou melhor justamente nos países que mais adotaram medidas de isolamento.
Muito mais importante do que o conteúdo da carta – que não é novidade para ninguém com o mínimo de bom senso – é seu poder simbólico. Depois de um ano de pandemia descontrolada, depois de reiteradas falhas na condução da crise por parte do governo, o mercado financeiro, que sempre esteve ao lado, ou pelo menos condescendente com Bolsonaro, resolveu se posicionar. A postura evidencia uma quebra de confiança na capacidade de superar a crise. Mais do que isso, mostra que o mercado começa a temer os prejuízos causados por ela.
O aumento da desconfiança na capacidade de enfrentamento da crise extrapola a Faria Lima. As últimas pesquisas de opinião têm mostrado quedas acentuadas na avaliação e cada vez mais entidades de peso como Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) se posicionam contra o presidente. Ele, atônito, diante de tudo isso parece estar se derretendo.
Apesar do derretimento de sua imagem, Bolsonaro continua firme em sua cadeira presidencial. A despeito dos inúmeros pedidos de impeachment que têm chegado ao congresso, os parlamentares não dão qualquer sinal de que querem levar adiante o processo para afastar o mandatário. É assustadora a inércia do congresso diante de tamanha irresponsabilidade com a saúde do povo brasileiro. Assustadora porque morrem mais de duas mil pessoas por dia em média. Porque está faltando leito, oxigênio e, agora, medicamentos usados para intubação. É asfixiante, angustiante pensar que a compra desses medicamentos foi cancelada pelo ministério da saúde em agosto do ano passado.
Até quando os deputados e senadores serão coniventes com isso? Se até o mercado financeiro já se posicionou, por que o Congresso não se move? Infelizmente, existe uma resposta bem pragmática para essas perguntas: Ficarão inertes enquanto o governo os estiver inundando de emendas parlamentares.
Em 2020, o governo Bolsonaro mais que dobrou os valores pagos em emendas. Foram R$ 17,4 bilhões de janeiro a outubro. No mesmo período do ano anterior, foram R$ 7,7 bilhões. Com tantos recursos disponíveis para atender suas bases eleitorais, os deputados e senadores, sobretudo, os do chamado centrão, que o apoiam, fecham os olhos para tragédia que vivemos diariamente. Se calam diante das fanfarronices do presidente e sua trupe. Eles não percebem, entretanto, que essa crise pesará sobre todos. Sobre eles também. Um eleitor fragilizado economicamente tende a desejar mudança na política e isso se reflete também nos cargos proporcionais, como os de deputados.
A exemplo do que fizeram os Faria Limers, os deputados do centrão precisam se posicionar. Precisam agir para frear o negacionismo do presidente que transformou o País em epicentro mundial da pandemia e que não gosta de ser chamado de genocida.