
Com a chegada da época caracterizada por ventos intensos e baixos índices de chuva, é comum ver crianças e adolescentes se divertindo ao empinar pipas, uma brincadeira tradicional bastante popular. Porém, quando praticada próxima à rede elétrica, essa atividade pode representar riscos sérios e causar danos consideráveis. Somente em 2024, a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) listou 2.664 incidentes relacionados a pipas em contato com a rede elétrica, afetando o fornecimento de energia para cerca de 765 mil consumidores. Na Região Metropolitana de Belo Horizonte, mais de 413 mil imóveis ficaram sem luz em decorrência de 1.141 registros.
Entre janeiro e maio de 2025, a concessionária contabilizou 853 casos desse tipo em todo o Estado, prejudicando o fornecimento para 248 mil clientes. Desse total, 428 episódios ocorreram na Grande BH, interrompendo o serviço em 147 mil unidades consumidoras.
“A eletricidade é invisível, mas letal. Quando a linha de pipa entra em contato com a rede, o risco de choque elétrico é real, mesmo sem encostar diretamente no fio. A corrente pode ser transmitida pela linha úmida ou metalizada, e a descarga pode ser fatal”, alerta o eletricista de redes de distribuição, Ronaldo da Silva.
Segundo o professor de física Roberto Dias, a preocupação é ainda maior quando há o uso de linhas cortantes, como cerol e linha chilena, materiais que aumentam o risco de rompimento dos fios e tornam a prática mais perigosa para ciclistas, motociclistas e pedestres.
“O poder de corte dessas linhas aumenta a chance de romper fios da rede elétrica. Quando isso ocorre, há risco de curtos-circuitos, faíscas e até quedas de cabos energizados em locais públicos, o que representa perigo de morte para quem estiver por perto. A linha chilena, em especial, contém maior quantidade de pó de quartzo e óxidos metálicos, o que pode torná-la mais condutiva de eletricidade, principalmente em dias úmidos. Assim, mesmo sem encostar diretamente no fio, a eletricidade pode ‘pular’ para a linha, causando um choque”, explica.
Desde dezembro de 2019, está em vigor em Minas Gerais a Lei 23.515/2019, que proíbe o uso e a comercialização de linhas cortantes, como o cerol e a linha chilena, em pipas, papagaios e objetos semelhantes. Quem for pego vendendo esse tipo de material pode ser multado em valores que vão de R$ 5.531 até R$ 276 mil, especialmente em casos de reincidência. Se a linha cortante estiver em posse de uma criança ou adolescente, os responsáveis legais serão notificados, e a situação será encaminhada ao Conselho Tutelar.
Para Silva, infelizmente, muitos ainda não têm noção do risco que estão correndo. “Pipas nunca devem ser empinadas próximo a redes de energia elétrica, subestações ou torres de transmissão, o ideal é buscar locais abertos, como campos e parques afastados da rede elétrica, e sempre com a supervisão de adultos, especialmente quando se trata de crianças”.
O profissional também alerta para outro comportamento de alto risco: tentar recuperar pipas presas em cabos de energia. “Jamais se deve tentar retirar uma pipa enroscada nos fios, esse é um dos principais motivos de choques graves envolvendo crianças e adolescentes. A orientação é abandonar a pipa e, se necessário, acionar a concessionária”.
Além da segurança individual, o impacto das ocorrências na rede elétrica afeta serviços essenciais como hospitais, escolas, comércios e sistemas de abastecimento de água, que dependem do fornecimento contínuo de energia elétrica para funcionar.