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Ensino público ainda não retomou aos níveis do período pré-pandemia

Época continua impactando a educação brasileira / Foto: Sumaia Villela/Agência Brasil

Embora os níveis de aprendizagem tenham avançado nos últimos anos, a pandemia de COVID-19 ainda impacta a educação brasileira, é o que revela o estudo do Todos Pela Educação, com base nos resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), aplicado para estudantes do 5º e do 9º ano do ensino fundamental e do ensino médio para avaliar o desempenho em matemática e língua portuguesa.

Em todas as etapas, os resultados de 2023 ainda não chegaram aos níveis atingidos em 2019. Por exemplo, no 5º ano do ensino fundamental, em 2023, 55,1% dos estudantes tinham aprendizagem adequada em língua portuguesa e 43,5%, em matemática. Esses índices eram de 56,5% e 46,7% em 2019, respectivamente. A educadora e doutora em educação, Josefina Baettens, conversou com o Edição do Brasil sobre o tema.

Quais são os principais fatores que impedem a retomada dos níveis de aprendizagem pré-pandemia?
A pandemia expôs e aprofundou desigualdades históricas do sistema educacional brasileiro. Entre os fatores mais críticos estão: o aumento da evasão escolar, o agravamento das vulnerabilidades socioeconômicas, as lacunas acumuladas nas aprendizagens essenciais e o esgotamento emocional de alunos e professores. Além disso, o período afetou as condições sociais em que a aprendizagem se dá. A ausência de interações sociais ricas e mediadas, fundamentais para o desenvolvimento cognitivo e emocional, interrompeu os processos coletivos de construção de conhecimento.

Como a formação e a valorização dos professores impactam esse quadro?
A recuperação da aprendizagem passa, de forma central, pela valorização e formação docente. Sem condições adequadas de trabalho, políticas de carreira atrativas e oportunidades efetivas de formação continuada, os professores – protagonistas do processo educativo – ficam limitados em sua atuação.

A alfabetização na idade certa continua sendo um desafio?
Sim, e com agravamento. A meta de alfabetização até o 2º ano do ensino fundamental tornou-se ainda mais distante para milhares de crianças. Muitos estudantes ingressaram nos anos finais do ciclo de alfabetização sem desenvolver as habilidades mínimas de leitura e escrita, o que compromete todo o percurso escolar subsequente. A alfabetização, por sua natureza, exige interações frequentes, feedback imediato e mediação constante do professor.

Há sinais de melhora no cenário atual?
Embora algumas redes e escolas tenham implementado ações promissoras, o panorama nacional segue crítico. Os avanços, quando existem, são localizados e ainda insuficientes para reverter o quadro geral de estagnação e retrocesso educacional. Superar esse cenário demanda não apenas ações pontuais, mas um esforço estruturado para reconstituir os vínculos sociais, a confiança no processo educativo e o engajamento dos estudantes.

Quais medidas emergenciais podem ser tomadas para recuperar a aprendizagem?
As medidas precisam ser articuladas, intensivas e baseadas em evidências. Entre elas destacam-se: implementação de programas de reforço e recuperação com base em diagnósticos precisos; ampliação da jornada escolar, com foco em atividades de recomposição das aprendizagens; acompanhamento psicossocial dos estudantes, com ações que fortaleçam o pertencimento escolar; investimento contínuo em formação docente, com ênfase nas aprendizagens essenciais e na reconstrução de práticas pedagógicas mediadoras; e fortalecimento da gestão escolar, com foco explícito na aprendizagem e no desenvolvimento de ambientes colaborativos de ensino.

O que pode ser feito para garantir que os avanços sejam duradouros e não pontuais?
É fundamental transformar ações emergenciais em políticas de Estado, com continuidade de financiamento, monitoramento rigoroso de resultados, fortalecimento da gestão educacional e centralidade na equidade. Além disso, é imprescindível consolidar políticas de formação e valorização docente que compreendam a aprendizagem como um processo que se dá na e pela interação social. Promover ambientes escolares ricos em diálogo, mediação e colaboração é condição para garantir a sustentabilidade das mudanças no longo prazo.