
Na última semana, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) criou o Grupo de Trabalho (GT) responsável por elaborar o Sistema de Sustentabilidade Financeira (SSF), regimento que funcionará como um fair play financeiro nacional. A proposta atende ao artigo 188 da Lei Geral do Esporte, que exige das entidades esportivas o controle econômico, financeiro e de governança das agremiações.
Até o momento, 28 clubes das Séries A e B do Campeonato Brasileiro, além de oito federações estaduais se comprometeram com o projeto. O GT terá sua primeira reunião oficial logo após o Mundial de Clubes da Fifa. Noventa dias após o encontro, será apresentada a versão final do SSF.
O advogado especialista em Direito Desportivo, Gustavo Lopes Pires de Souza, aponta a relevância da iniciativa, destacando que a CBF cumpre uma obrigação legal. “O artigo 188 da Lei Geral do Esporte determina que as entidades de administração, como a própria CBF, implementem mecanismos de controle econômico, financeiro e de governança dos clubes. O objetivo é garantir mais equilíbrio e sustentabilidade no futebol”.
Ele afirma que a entidade reguladora precisa agir dentro de parâmetros delineados pela Constituição, respeitando princípios como legalidade, isonomia e transparência. “Ou seja, a CBF não pode criar regras que sejam desproporcionais ou que acabem, de forma indireta, prejudicando determinados clubes”.
Para Souza, o Brasil precisa de um sistema de responsabilidade financeira, mas adaptado à realidade do futebol brasileiro. “Isso significa criar regras que sejam rigorosas, porém, realistas. Que cobrem dos clubes responsabilidade, mas que também deem condições para quem está em situação financeira mais frágil se reorganizar”.
“Não dá para simplesmente copiar e colar o modelo europeu. A realidade dos clubes brasileiros é muito diferente, com disparidades econômicas muito maiores e dificuldade histórica de fiscalização”, acrescenta.
É necessária uma transição planejada e escalonada, segundo Souza. “Os critérios podem incluir o nível de endividamento, a forma de gestão, se ainda é associação ou se virou Sociedade Anônima do Futebol (SAF), o grau de profissionalização e até o perfil da receita de cada clube. É essencial garantir que o sistema não se transforme em uma armadilha que puna quem já enfrenta dificuldades”.
O especialista avalia que um SSF bem desenhado tem o potencial de atrair investidores, não de afastá-los. “Afinal, quem investe quer segurança, regras claras e previsibilidade. O que não pode acontecer é o sistema ser uma camisa de força, criando barreiras que acabam desestimulando quem quer profissionalizar o futebol”.
O advogado Douglas Sanguinete Ribeiro alerta que para evitar o favorecimento dos clubes com mais receita e os de menor receita sejam punidos por descumprir as regras, é necessário implementar critérios proporcionais, considerando o faturamento, a capacidade de investimento e a estrutura de cada equipe. “O órgão responsável pela fiscalização deve atuar com imparcialidade, independência e total transparência nas decisões. Só haverá verdadeiro ‘jogo limpo’ se o regulamento for justo desde a sua constituição até a sua aplicação prática, levando em consideração a desigualdade estrutural existente entre os clubes”.