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84% da população negra afirma ter sofrido discriminação racial

Foto: Freepik.com

 

Segundo uma pesquisa apoiada pelo Ministério da Igualdade Racial (MIR), 84 em cada 100 pessoas negras afirmam já ter sido alvo de discriminação racial. O estudo aborda as vivências de brasileiros que enfrentam diferentes formas de preconceito no dia a dia, em situações comuns da rotina. Os dados revelam que 51,2% das pessoas negras relatam receber um tratamento menos cordial no cotidiano. Entre os indivíduos pardos, esse índice é de 44,9%, enquanto entre os brancos a proporção cai para 13,9%.

Além de identificar a presença de discriminação, a pesquisa também investigou os tipos de preconceito vivenciados pelos participantes. Entre as pessoas negras, 84% relataram que a cor da pele foi o principal motivo. Já entre os brancos, esse número foi de 8,3%, e entre os pardos, 10,8%. O estudo também analisou casos em que os entrevistados enfrentaram múltiplas formas de discriminação, destacando que as mulheres negras estão entre as mais afetadas: 72% delas disseram ter sido alvo de mais de um tipo de preconceito. Para discutir o assunto, o Edição do Brasil conversou com o diretor de Relações Internacionais da União de Negras e Negros pela Igualdade (Unegro), Alexandre Braga.

 

Como esses dados reforçam o entendimento do racismo como estrutural no Brasil?

A desigualdade social no Brasil tem raízes profundas que remontam ao período da colonização. Com a abolição formal da escravidão, em 1888, não foram implementadas políticas públicas eficazes que garantissem a inclusão dos ex-escravizados na sociedade, como acesso a trabalho digno, moradia, alimentação e assistência social. Esse abandono contribuiu diretamente para a configuração da desigualdade social que persiste até os dias atuais. Historicamente, a população branca manteve o controle sobre as estruturas de poder, perpetuando privilégios e exclusões.

 

Que barreiras estruturais impedem o acesso de pessoas negras a melhores posições e salários?

A principal delas é o racismo, que consiste na marginalização de indivíduos com base em sua origem racial ou étnica. Essa forma de discriminação deve ser analisada sob múltiplos ângulos, sociais, políticos, religiosos, culturais e geográficos. Historicamente, no Brasil, pessoas negras foram tratadas como inferiores e privadas de direitos básicos. Ao observarmos dados relacionados à renda, ocupação de cargos de liderança nas empresas e índices de violência, fica evidente que a população negra é a mais impactada negativamente.

 

De que forma essas desigualdades impactam a saúde mental e o acesso à cidadania plena da população negra?

Mesmo com qualificação igual e ocupando funções idênticas, trabalhadores negros ainda recebem salários inferiores aos de colegas brancos. Além disso, há uma desigualdade evidente na distribuição das ocupações: pessoas negras estão majoritariamente inseridas em profissões com menor reconhecimento social e remuneração reduzida, como motoristas, faxineiras, empregadas domésticas, garis e porteiros. Essas funções são desvalorizadas não apenas em termos profissionais, mas também em relação ao poder aquisitivo que proporcionam. Diante dessas limitações, muitos acabam sendo empurrados para áreas periféricas, favelas e regiões de moradia precária nos grandes centros urbanos, distantes das oportunidades sociais e econômicas.

 

Qual é o papel da sociedade civil na luta contra o racismo?

Não basta apenas rejeitar atitudes racistas, é necessário adotar uma postura ativa de enfrentamento ao racismo. A transformação real só será possível quando toda a sociedade, incluindo o setor público, o setor privado e os cidadãos, se comprometer de forma coletiva com a superação dessa injustiça histórica. Isso envolve fortalecer políticas públicas voltadas à população negra e ampliar investimentos em áreas como educação, cultura, saúde e assistência social.

 

O que pode ser feito pelo poder público para promover justiça racial?

Atualmente, o problema não é a ausência de políticas públicas, mas sim a falta de recursos financeiros e de estrutura para colocá-las em prática de maneira eficaz. Muitas prefeituras enfrentam limitações orçamentárias que impedem a implementação de ações afirmativas. Também há entraves políticos, visto que muitos gestores municipais pertencem a correntes ideológicas que se opõem a medidas como cotas raciais ou políticas voltadas à população negra. Por isso, a representatividade política também tem papel central nesse processo, o que torna essencial a eleição de pessoas negras para cargos como vereadores, deputados, senadores e governadores.