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Estudo indica que três em cada dez adultos são analfabetos funcionais

Foto: Geovana Albuquerque/Agência Brasília

Dados do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) revelam que 29% da população entre 15 e 64 anos são analfabetos funcionais, ou seja, não sabe ler e escrever ou possui um nível tão básico que não consegue compreender pequenas frases, identificar números de telefone ou interpretar preços. Essa porcentagem se manteve igual à de 2018. Entre os jovens de 15 a 29 anos, o índice de analfabetismo funcional subiu de 14%, em 2018, para 16% no ano passado. Para compreender esse cenário, o Edição do Brasil conversou com Heloisa Trenche, assessora de projetos educacionais da ONG Ação Educativa.

Quais são os principais fatores que contribuem para a persistência do analfabetismo funcional no Brasil?
Uma combinação de fatores estruturais, pedagógicos, econômicos e sociais explicam a permanência desses índices. A pesquisa indica duas frentes que precisam ser priorizadas nas políticas públicas: a melhoria da qualidade da educação básica e a ampliação da oferta da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Os jovens apresentaram melhores níveis de alfabetismo, mas ainda é necessário elevar a qualidade do ensino para reduzir o número de estudantes que concluem etapas da educação sem domínio da leitura e da escrita. Muitos alunos passam pela escola de forma invisível, e é essencial garantir a alfabetização desde os anos iniciais do ensino fundamental.
Outro ponto é a falta de investimentos na valorização dos profissionais da educação e na formação continuada. Muitas escolas enfrentam sérios problemas de infraestrutura, como ausência de bibliotecas, quadras ou laboratórios, prejudicando diretamente o processo de aprendizagem. As matrículas no EJA vêm caindo devido à falta de investimento e à baixa atratividade das ofertas. 97% das pessoas sem escolaridade estão nos níveis mais baixos da escala de alfabetismo. Além disso, 65% dos adultos entre 40 e 64 anos são analfabetos funcionais, um público que teve o direito à educação negado no passado e que precisa de políticas de reparação para garantir sua autonomia em uma sociedade letrada.

De que forma a desigualdade socioeconômica influencia os níveis de alfabetismo funcional?
Famílias com maior escolaridade e renda tendem a ter filhos com melhor desempenho escolar. Por outro lado, escolas em áreas periféricas enfrentam dificuldades adicionais. Fatores como a fome influenciam diretamente a atenção e o aprendizado, demonstrando como a desigualdade social impacta fortemente os níveis de alfabetismo funcional. Medidas como merenda escolar de qualidade, transporte gratuito e programas de transferência de renda, como o Bolsa Família e o Pé-de-Meia, ajudam a garantir a permanência dos estudantes.

Quais políticas públicas ou iniciativas educacionais têm sido mais eficazes no combate ao problema?
Campanhas como o Programa Brasil Alfabetizado, que está sendo implementado no âmbito do Pacto Nacional pela Superação do Analfabetismo, são extremamente necessárias. Outras iniciativas incluem o Projovem, a ampliação do fator de ponderação da EJA no Fundeb e o Pé-de-Meia, que agora também contempla jovens e adultos da EJA. São muitas as ações previstas e embora o investimento ainda esteja abaixo do ideal, os esforços são significativos.

Como a alfabetização funcional afeta a empregabilidade e a inserção no mercado de trabalho?
Pessoas com baixa alfabetização têm dificuldades para compreender instruções, preencher formulários e interpretar gráficos e planilhas, habilidades essenciais no mundo do trabalho. Isso limita suas oportunidades e as torna mais vulneráveis a empregos precários. O Inaf mostra que, entre os que têm baixa proficiência, 60% estão empregados. Já entre os alfabetizados proficientes, esse número sobe para 74%.

Entre os alfabetizados proficientes, 40% apresentam desempenho digital médio ou baixo. Como a educação pode integrar melhor o letramento digital?
Embora os jovens tenham mais familiaridade com ferramentas digitais, habilidades complexas como argumentação e análise crítica da informação precisam ser ensinadas. A desigualdade no acesso à internet e a dispositivos também restringe o desenvolvimento dessas competências. As escolas devem promover a educação midiática, preparando os estudantes para um uso ético e criativo das tecnologias, indo além do consumo passivo de conteúdo. É fundamental garantir que todos tenham acesso às ferramentas e aprendam a utilizá-las de forma crítica e produtiva.