Escrito pelo diretor-geral da Rede Batista de Educação, professor Valseni Braga
Vivemos a mais radical transformação cognitiva desde a invenção da escrita. A inteligência artificial (IA) não é apenas uma ferramenta sofisticada. Ela é uma ruptura. Algoritmos que escrevem, traduzem, desenham, diagnosticam, conversam. Máquinas que aprendem. Sistemas que preveem. E o espanto: muitos fazem isso melhor e mais rápido do que qualquer ser humano.
Como educador, a pergunta que me atravessa não é tecnológica. É puramente humana. Se a inteligência artificial pode fazer tudo o que a escola sempre ensinou, o que resta à escola?
Nas 15 unidades do Colégio Batista Mineiro e nas 7 do Colégio Batista Brasil, essa pergunta não é nova. Desde 2017, muito antes da explosão do ChatGPT ou das plataformas generativas, refletimos sobre o papel da inteligência artificial nos processos pedagógicos da Rede Batista de Educação. Mas agora, mais do que nunca, essa reflexão se torna urgente – e estratégica.
Há oportunidades poderosas. A inteligência artificial pode personalizar o ensino em escala. Pode libertar o professor de tarefas repetitivas para que ele seja, de fato, o mentor da alma e da mente. Pode ajudar no diagnóstico precoce de dificuldades de aprendizagem, criar trilhas adaptativas e ampliar o repertório de investigação científica, mesmo nos primeiros anos da vida escolar.
Mas não nos iludamos: também há ameaças profundas. A primeira delas é a perda do esforço. Em um mundo em que tudo está a um prompt de distância, o risco é formar estudantes que sabem buscar respostas, mas não sabem fazer perguntas. Que dominam a interface, mas não entendem os fundamentos. Que reproduzem soluções, mas jamais desenvolveram a capacidade de intuir, argumentar ou discernir.
A segunda ameaça é mais sutil: a erosão da consciência. A inteligência artificial pode nos tornar eficientes, mas não necessariamente éticos. A educação, portanto, precisa assumir um papel de resistência: preservar e cultivar o que nenhuma máquina é capaz de simular com verdade – o caráter.
É por isso que insistimos tanto na formação integral. Para nós, ensinar não é apenas instruir. É formar. É esculpir a interioridade de um ser humano para que ele saiba como agir quando ninguém estiver olhando. Para que ele use a tecnologia com discernimento, e nunca como um atalho para escapar do processo, do tempo ou da responsabilidade.
As incertezas são muitas – e inevitáveis. O que será da prova escolar quando a inteligência artificial puder responder melhor do que o estudante? O que será da autoria quando os textos gerados se confundirem com os produzidos? O que será do professor quando seus métodos forem desafiados por plataformas inteligentes?
Não temos respostas definitivas. Mas temos princípios inegociáveis. Sabemos que a educação não pode ser reduzida a acertos. Ela precisa gerar consciência, compaixão, domínio próprio. E isso não se programa. Se testemunha. Se transmite.
A inteligência artificial talvez ensine mais. Mas jamais formará melhor. Porque ensinar é transferir conhecimento. Formar é transmitir vida.
E essa, ainda é – e sempre será – a missão da escola. E da Rede Batista de Educação.