
Segundo um relatório da Organização Não Governamental (ONG) Oxfam, o mundo registrou, em média, quatro novos bilionários por semana em 2024. No total, esse número aumentou de 2.565 em 2023 para 2.769 no ano passado. Juntas, essas fortunas alcançaram a marca de US$ 15 trilhões.
Por dia, o patrimônio dessas pessoas cresceu US$ 5,7 bilhões, em uma taxa três vezes superior à do ano anterior. Por outro lado, o documento destaca que, conforme o Banco Mundial, o número de pessoas que vivem na pobreza se manteve igual. Para discutir o tema, o Edição do Brasil conversou com a diretora-executiva da Oxfam Brasil, Viviana Santiago.
O relatório aponta que a riqueza dos bilionários aumentou três vezes mais rápido em 2024 do que em 2023. O que impulsionou esse crescimento e quais seriam as principais consequências para a economia?
Esse fenômeno pode ser explicado pela concentração crescente de riqueza desde a década de 1980. De acordo com o economista Gabriel Zucman, as fortunas dos bilionários expandiram-se mais rapidamente do que a economia global como um todo. Esse padrão reflete um aumento desigual, no qual as famílias mais ricas têm acumulado uma parcela cada vez maior do patrimônio mundial. Por exemplo, a riqueza dos 0,0001% mais abastados, que representava 3% do Produto Interno Bruto (PIB) global em 1987, agora corresponde a 13%.
Quase quatro novos bilionários surgiram por semana em 2024. Como essa velocidade na criação de fortunas extremas reflete a estrutura econômica global atual e o impacto das políticas públicas?
A riqueza está crescendo muito mais rápido do que prevíamos. Isso significa que a taxa média de avanço anual das grandes fortunas disparou. Apenas os dez homens mais ricos do mundo viram seu patrimônio aumentar, em média, quase US$ 100 milhões por dia em 2024. A rápida criação de novos bilionários evidencia um sistema econômico global que concentra cada vez mais recursos no topo, favorecendo aqueles que já possuem grandes fortunas. A ausência de políticas públicas eficazes desempenha um papel central nesse cenário. Baixos impostos sobre riqueza, falhas na regulação de monopólios e a falta de mecanismos de redistribuição contribuem para essa concentração. Sem medidas governamentais para regular essas práticas e distribuir recursos de maneira mais equitativa, a desigualdade tende a se aprofundar.
Pelo menos cinco trilionários devem surgir na próxima década. Que medidas podem ser adotadas para evitar a concentração extrema de riqueza e seus impactos na desigualdade?
Primeiro, é essencial que os governos implementem políticas para garantir que a renda dos 10% mais ricos não ultrapasse a dos 40% mais pobres, acelerando a erradicação da pobreza. É fundamental reformar a tributação global, assegurando que os mais ricos paguem sua parcela justa e combatendo os paraísos fiscais. Além disso, tributar grandes heranças ajudaria a desmontar uma nova aristocracia econômica. Também é necessário desmantelar monopólios, democratizar as regras comerciais e garantir que as corporações paguem salários dignos, ao mesmo tempo em que se reestruturam instituições financeiras internacionais para garantir uma representação mais justa dos países do Sul Global.
Atualmente, 60% da riqueza dos bilionários provêm de herança, monopólios ou conexões políticas. Como enfrentar essa grande concentração de recursos?
Reformas tributárias são fundamentais para reduzir a extrema concentração de riqueza e promover maior justiça econômica. Impostos progressivos sobre grandes heranças ajudariam a mitigar esse efeito, garantindo que o patrimônio acumulado beneficie a sociedade como um todo. Uma tributação mais rigorosa sobre grandes fortunas poderia financiar políticas públicas essenciais, como educação, saúde e proteção social, reduzindo desigualdades estruturais.
No Brasil, como a concentração de riqueza e a criação de novos bilionários têm impactado a desigualdade social?
A concentração de riqueza no Brasil está profundamente ligada a um histórico de exclusão social, no qual populações negras, indígenas e periféricas têm menos acesso a oportunidades econômicas e educacionais. Além disso, o sistema tributário brasileiro é altamente regressivo, com elevados impostos sobre o consumo e baixa tributação sobre renda e patrimônio, o que aprofunda ainda mais a desigualdade, tornando-o um dos mais injustos do mundo.