Segundo o “Quarto Censo da População Adulta em Situação de Rua”, realizado em parceria entre a Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania e a Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a população em situação de rua de Belo Horizonte quase triplicou na última década, chegando a 5.344 pessoas.
A pesquisa ocorreu de 19 a 21 de outubro de 2022 e contou com a participação de 300 pesquisadores que se deslocaram pelas nove regionais da capital. Em 1998, foram registradas 916 pessoas em situação de rua, em 2005, o número subiu para 1.164, e em 2013, chegou a 1.827 indivíduos.
O estudo mostra que a maioria dessa população é composta por homens, que representam 84%, com uma idade média de 42,5 anos. As mulheres, por outro lado, correspondem a 16% e têm uma idade média de 38,9 anos. Dentre os homens, 793 (35%) relatam ter começado a viver em situação de rua nos últimos dois anos e oito meses, período que coincide com o início da pandemia de COVID-19.
Para a socióloga Andreia Lima, a crise econômica é uma das principais responsáveis por essa realidade. “Muitas famílias que já enfrentavam dificuldades financeiras foram empurradas para a vulnerabilidade extrema, perdendo seus lares e recursos básicos. Além disso, o alto custo de vida, aliado à falta de políticas públicas eficazes de assistência social, tem contribuído para o aumento da população em situação de rua”.
“A falta de moradias acessíveis e a desigualdade social desempenham um papel crucial nesse cenário. A cidade enfrenta um déficit habitacional que atinge principalmente as camadas mais pobres da população. Sem acesso a uma moradia digna, muitos se veem obrigados a viver nas ruas”, completa.
No que diz respeito à orientação sexual, 90,2% dos participantes da pesquisa se identificam como heterossexuais, enquanto 3,7% se consideram bissexuais, 2,2% gays, 1,4% lésbicas e 2,6% pertencem a outras orientações. A pesquisa também indica que a maior parte da população se reconhece como preta ou parda, totalizando 81,4%. Os brancos representam 14,6%, enquanto 1,5% se identificam como indígenas e 1% como amarelos.
O tempo médio de vida nas ruas aumentou de 7,4 anos em 2013 para 11 anos. Entretanto, 40,5% dos entrevistados reportaram ter algum problema de saúde, 1,5 vezes maior que o relatado pelo censo de 2013.
Entre os homens, os principais motivos que levaram a essa condição de vida foram o desemprego (19,6%), a separação (10,9%) e conflitos com grupos rivais (3,9%). Para as mulheres, os relatos incluíram violência doméstica (9,0%) e a falta de moradia devido a desastres naturais (4,1%). Além disso, 91,1% dos entrevistados expressaram o desejo de deixar a situação de rua.
O psicólogo Marcos Figueiredo diz que a realidade é difícil para aqueles que habitam as ruas de Belo Horizonte. “Muitos enfrentam não apenas a falta de abrigo, mas também a escassez de alimentos e o preconceito. Relatos de violência e discriminação são comuns, e muitos se sentem invisíveis para a sociedade”.
Ele explica que fatores como violência doméstica, abuso de substâncias e problemas de saúde mental podem levar, com frequência, indivíduos a deixarem seus lares. “Somando-se a isso, a falta de programas eficazes de assistência social e acolhimento, além de abordagens inadequadas para a reintegração, agravam a situação”.
Andreia ressalta ser necessário a criação de um plano integrado que ofereça não apenas abrigo, mas também promova a inclusão social e a reinserção no mercado de trabalho. “A abordagem deve ser multifacetada, envolvendo saúde, educação e capacitação profissional. A ajuda imediata é importante, mas precisamos de soluções a longo prazo”.