O Brasil possui 300.868 pessoas que vivem em situação de rua, segundo um levantamento feito pelo Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua, da Universidade Federal de Minas Gerais (OBPopRua/POLOS-UFMG). Em dezembro de 2023, esse total era de 242.756, um aumento de 23,93%. O Estado de São Paulo aparece em primeiro lugar com 126.112 pessoas, seguido pelo Rio de Janeiro, com 29.816.
A maioria dessa população é negra e do sexo masculino, além disso, 14% apresentam alguma deficiência e a maior parte (42%) tem ensino fundamental incompleto. O levantamento foi feito com base nos dados do Cadastro Único de Programas Sociais (CadÚnico). Para debater o assunto, o Edição do Brasil conversou com a antropóloga, pesquisadora e professora do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Regina Medeiros.
Quais foram os principais fatores que influenciaram no aumento da população em situação de rua?
A população que vive na rua aumentou sensivelmente não só no Brasil, como em outros países, especialmente depois do isolamento social, decorrente da pandemia COVID-19. Trata-se de um fenômeno multifatorial, marcado especialmente pelas consequências políticas, econômicas e sociais que ficaram mais acirradas com a pandemia.
Faltam investimentos e/ou políticas públicas adequadas para diminuir esse índice?
Sim. Faltam investimentos, políticas públicas e vontade política para solucionar esse problema social. Particularmente, para resolver as questões relacionadas à moradia, trabalho, escolaridade e formação de mão de obra para que essas pessoas possam se inserir no mercado de trabalho.
Segundo a pesquisa, o perfil dessa população é de maioria negra, sexo masculino e entre 18 e 59 anos. Por que esse grupo é o mais atingido?
Isso pode ser explicado pela desigualdade estrutural no território brasileiro, marcada ao longo da história, que cria um sistema hierárquico privilegiando determinadas classes sociais em detrimento às outras consideradas inferiores. Os recursos, as oportunidades e os direitos são distribuídos de forma desigual, o que traz como efeito a pobreza, a miséria e o acesso limitado às condições básicas de sobrevivência de qualquer ser humano.
Quais são os desafios para ter acesso à moradia digna no Brasil?
Para uma moradia digna é imprescindível um trabalho com salário que garanta uma qualidade de vida, o exercício da cidadania e os direitos humanos. Não basta as medidas paliativas, como comumente assistimos nos discursos e práticas vindas de nossos governantes. Isso só retroalimenta os problemas já existentes.
Você acredita que o número deve aumentar ou diminuir nos próximos períodos?
Se pensarmos no Brasil, com a política de educação, formação de mão de obra, emprego, e se o problema for estrutural, pelo que tenho estudado, possivelmente o índice pode diminuir. Porém, o país tem recebido muitos imigrantes internos, como também externos, que buscam melhores condições de vida no território brasileiro, e isso pode ser um empecilho. Esses grupos chegam com suas famílias e não conseguem um trabalho com remuneração suficiente para a manutenção e sobrevivência dos seus entes. Assim, as políticas direcionadas à essa população devem levar em conta as particularidades e os fatores provocadores dessa situação miserável de vida.