O bullying é o comportamento sistemático de agressão física, moral e psicológica realizado por uma pessoa ou grupo com outro indivíduo. Os efeitos dessa violência acarretam sofrimentos profundos e podem manter danos psicológicos no subconsciente das vítimas. De acordo com um artigo recente da revista científica Harvard Review of Psychiatry, a prática na infância causa 27 vezes mais chances de desenvolvimento do transtorno de pânico entre mulheres e 18 vezes mais entre os homens no início da vida adulta.
Além disso, segundo o levantamento do Observatório Febraban – Pesquisa Febraban Ipespe “Bullying e Cancelamento: Impacto na vida dos brasileiros”, 79% dos entrevistados acham que os casos cresceram no Brasil. A impressão sobe para 85% em relação a essa prática por meio dos celulares, mídias sociais e jogos. E a preocupação com o tema aumenta na mesma medida. Para 75% dos entrevistados, atitudes que discriminam, humilham ou ridicularizam alguém não podem ser consideradas como “brincadeira”.
Apesar do impacto, quase metade dos entrevistados (49%) considera que o tema tem sido tratado de forma insuficiente. Entre os mais jovens, de 18 a 24 anos, 57% acham que o assunto é abordado com descaso. A pesquisa foi realizada entre os dias 21 de maio e 2 de junho deste ano, com 3 mil pessoas nas cinco regiões do país.
Para o psicólogo parental, Filipe Colombini, o bullying pode ser realizado em diversos lugares, como a escola ou interação on-line (redes sociais), chamado de cyberbullying. “As causas são multifatoriais, podendo ter modelos parentais/familiares de agressão; déficit em habilidades sociais; busca de reconhecimento social/grupal; dificuldade de interação social; baixa autoestima e de confiança. Tais fatores podem estar relacionados tanto às pessoas que fazem, recebem e/ou observam a prática. Não há posições fixas nessas situações e sim, papéis dinâmicos, pois quem sofre o bullying pode praticá-lo e vice-versa”.
Ainda de acordo com a Febraban, escolas e faculdades são locais que deveriam dar um suporte aos alunos, mas, segundo a pesquisa, são os principais espaços para o cometimento do bullying. 63% dos entrevistados disseram que sofreram em instituições de ensino, enquanto 25% afirmaram que foi por meio de celulares, mensagens ou redes sociais, e 4% em locais de trabalho ou próximo de casa.
Colombini diz que esses ambientes devem promover ações coletivas para se falar sobre o assunto e formas de agir contra tal agressão. “É essencial tornar essa denúncia necessária e ativa no ambiente escolar, perpassando para as discussões familiares e de amigos. Evitar achar culpados, e sim promover uma gestão de conflitos em que todos são participantes”.
O psicólogo aconselha que os pais das vítimas e dos agressores conversem abertamente com os filhos, evitando mais punições e contra agressões. “Mediar tais conflitos junto com a escola por meio de reuniões parentais, com os professores, equipe gestora, etc. Não rotular quem são os culpados, pois os papéis não são fixos e todos precisam se envolver para lidar com o contexto de violência”.
Ele ressalta que é mais importante focar na prevenção do que em ações remediativas. “Validar e incentivar ações de denúncias ativas e coletivas, na qual todos possam se abrir sobre o que está sentindo e pensando, além de discutir sobre preconceito, violência de gênero, etc. A escola precisa tornar o tema uma discussão mais natural e menos encoberta”.
Colombini também faz um adendo de que o presenciador também pode ser um agravante para toda a situação. “O espectador pode alimentar o bullying, dando atenção e voz ao agressor, por exemplo. Ele pode assumir um papel ativo ou passivo e todas essas formas de interação prejudicam ainda mais a situação”.
Segundo o psicólogo, os efeitos podem ser físicos e psicológicos para a vítima dessa violência e perseguição. “Queda da imunidade; dores de cabeça; irritabilidade; extrema tristeza; ansiedade; sensação de esgotamento; aumento de propensão de transtornos psiquiátricos e de comportamentos impulsivos; abuso de substâncias; autoagressões e até tentativa de suicídio”.
A estudante T.M.*, conta que aos 14 anos começou a ser vítima de bullying por ser homossexual e que isso durou cerca de 2 anos. “Eu sofria agressões verbais de colegas um pouco mais velhos do que eu e me sentia um lixo, decidi não contar para meus pais nem para nenhuma autoridade da escola, apenas me distanciava das pessoas”.
A situação só chegou ao fim quando ela decidiu mudar de escola, por não aguentar mais viver aquilo diariamente. “Infelizmente, o respeito não é ensinado da forma correta, as pessoas só se preocupam consigo mesmas e não ligam para como o outro se sente. Acredito que o bullying pode existir em qualquer idade, mas os adolescentes são os que mais sofrem, na maioria das vezes passa despercebido, pois tanto nas escolas quanto nas famílias é julgado como ‘brincadeira’ de alunos ou uma fase que algum dia vai passar”
*A pedido da entrevistada, o seu nome foi preservado.