Não só quem ficar para pagar a “saideira”, mas a roda inteira deve-se preparar para desembolsar mais se quiser degustar uma cerveja durante este ano. Isso porque especialistas do setor cervejeiro estimam que a bebida alcoólica preferida dos brasileiros deva encarecer de 10% a 15% em 2021. A projeção é da Escola Superior de Cerveja e Malte (ESCM).
A falta de perspectiva de saída da crise econômica gerada pela pandemia do novo coronavírus e o frequente aumento do dólar, moeda em que são comprados o malte e o lúpulo, principais insumos da cerveja, são algumas das causas apontadas para o aumento significativo. “Os comerciantes estão segurando os preços o máximo que podem, e embora não seja possível cravar uma porcentagem, o reajuste deve ser de até 15%. A constante alta do dólar gerou impacto no custo das commodities, sem contar a despesa com energia elétrica, que também aumentou. Esses fatores tiveram influência direta no preço das bebidas”, afirma Carlo Enrico Bressiani, diretor da ESCM.
Os dados do setor são grandiosos, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil), cerca de 14,1 bilhões de litros do líquido são produzidos no país por ano, o que gera R$ 107 bilhões de faturamento anualmente e representa 1,6% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Além disso, 2,7 milhões de pessoas são empregadas por essa indústria.
De acordo com Bressiani, o empresário cervejeiro fez o possível para segurar os repasses, porém, a conta chegou em 2021. “O Brasil é um país fechado, cheio de burocracia e que enfrenta problemas com a variação cambial. Quem sofre mais são as pequenas empresas, porque a maioria não tem contratos de compra e fornecimento mais estáveis e adquirem produtos conforme a demanda, mas até os grandes terão de aumentar o preço para o consumidor final”, acredita.
Outro desafio apontado pela indústria é a falta de embalagens. Segundo dados do semestre divulgados pela Associação Brasileira dos Fabricantes de Latas de Alumínio (Abralatas), a cerveja, que ocupava 55% do mercado das embalagens de alumínio antes da quarentena, chegou a junho com um recorde de 70% da fatia entre as bebidas envasadas em latas.
“O foco principal que desencadeou essa falta no mercado foi a mudança de hábito de consumo durante a pandemia. As pessoas migraram dos bares e restaurantes, onde o maior consumo é em garrafa, e passaram a consumir mais em casa, onde a maior ingestão é em lata. Essa alteração ocorreu de forma repentina e inesperada, afetando a demanda instalada destes setores. Para os consumidores, as latinhas são preferência devido ao preço unitário ser mais barato do que a garrafa de vidro. Para as distribuidoras, como supermercados, além de mais barato também é mais fácil de transportar e armazenar”, explica Edinelson Marques, gerente comercial de uma empresa especializada em comércio exterior e logística aduaneira.
Porém, segundo o especialista, não há escassez de alumínio, até porque a maior parte da matéria-prima produzida volta por meio da reciclagem, algo que não é tão comum na cadeia de vidro. “O que falta é produção industrial na escala necessária para atender a esse novo padrão de consumo. Por isso a maior cervejaria do Brasil, a Ambev, recentemente inaugurou uma nova Fábrica de Latas, em Minas Gerais, para tentar equilibrar essa nova demanda de mais latas e menos garrafas”, analisa Marques.
Na avaliação do especialista, esse encarecimento, não deve ter grandes efeitos no consumo de cerveja do brasileiro. “Independentemente do tipo de bebida, especialmente as cervejas nacionais, as embalagens, em geral, são latas, garrafas pet e caixas de alumínio. Geralmente, o preço não vem só da embalagem, mas também de matérias-primas, que são todas importadas e que tem o preço vinculado ao dólar. Logo, tudo aumenta, não há muita saída. Se a moeda americana sobe, o malte fica mais caro, a cevada fica mais cara, o milho, que mesmo sendo nacional é uma commodity, também fica mais caro, pois está vinculado ao dólar. A mesma coisa ocorre com o alumínio. Portanto, não vejo o consumo do brasileiro mudando, pois a cadeia toda é afetada, logo tudo encarece”, diz.
Questionado sobre a expectativa de aumento no valor da cerveja, Paulo Petroni, diretor-geral da CervBrasil, declarou que a associação “não comenta sobre preço dos produtos por entender que é uma estratégia particular de cada empresa”. Porém, acrescentou que a CervBrasil estima que a queda de produção da bebida pode se aproximar de 4% em 2021 em relação a 2020, quando foram produzidos cerca de 13,8 bilhões de litros do líquido. “Entendemos que as mudanças de padrão de consumo de embalagens retornáveis para descartáveis, a alta do consumo no domicílio frente ao fora de casa e o aumento gradual do consumo de cervejas puro malte, devem estar presentes na mesma magnitude em 2021”, concluiu.