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Apesar de defendido por Bolsonaro, uso da cloroquina não é consenso entre especialistas

Os cientistas do mundo inteiro estão atrás de um composto que irá curar a COVID-19 ou uma vacina para evitar que as pessoas se contaminem com esse novo vírus. No momento, há inúmeras drogas que estão sendo testadas em diversos pacientes contaminados, mas uma em especial ganhou destaque no noticiário: a cloroquina.

A cloroquina ou hidroxicloroquina ganhou projeção mundial como possível solução nessa crise após a publicação de um estudo na França, em meados de março, realizado pelo infectologista Didier Raoult, da Universidade de Medicina de Marselha. Mesmo sem uma testagem em larga escala, alguns presidentes, como é o caso de Donald Trump e Jair Bolsonaro, passaram a defender o uso desse medicamento.

Usada para o tratamento de malária; doenças reumáticas autoimunes, como lúpus e artrite reumatoide; e afecções dermatológicas, a prescrição dessa droga foi liberada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), no último dia 24, para situações específicas, seguindo critério médico e com consentimento do paciente. “Estudos in vitro demonstraram que há redução da carga viral, inibindo crescimento e replicação do vírus e imunomodulação da resposta inflamatória. Porém, ainda não há consenso do uso da medicação”, explica Flávia Nascimento, médica especialista em reumatologia.

Ela completa dizendo que há diversas drogas em estudo, mas nenhuma se mostrou capaz de controlar a doença. “Um remédio para o tratamento deve demorar mais de 2 meses. Já uma vacina, pelo menos um ano para conseguirmos algo eficaz e produzir em larga escala, pois os processos são lentos e dependem de uma possível mutação viral”.

A demora em encontrar uma vacina acontece porque, inicialmente, a testagem é feita em animais, seguindo para outras três fases e, logo após esse processo, há os testes em humanos para sua possível produção. “Todo medicamento passa por um longo processo de pesquisa e desenvolvimento, sendo que há fases de teste pré-clínico laboratorial e em animais. Após isso, temos os ensaios clínicos, divididos também em três fases. Pra falar sobre esse assunto, estou simplificando o processo para ser mais didática, pois esses testes levam anos para a conclusão e podem, após todo o investimento, não serem viáveis para uso”.

Riscos da automedicação

Após a divulgação do estudo e falas de autoridades sobre o uso da cloroquina no combate a COVID-19, houve uma corrida às farmácias para a compra do medicamento, tanto que alguns estabelecimentos não o tinham em estoque mais. Devido a essa realidade, Flávia alerta para o risco da automedicação e para o fato de que esse desabastecimento é prejudicial para as pessoas que tomam esse remédio de maneira contínua.

“A cloroquina foi descoberta em 1934, sendo, até o momento, segura quando indicada por um profissional capacitado no seu manejo. Sabemos que os efeitos colaterais existem e a dose dependente quando pensamos em curto prazo. A automedicação deve ser combatida sobre qualquer medicação, mas a cloroquina pode trazer prejuízos à condução dos estímulos cardíacos, prolongando o intervalo QT, medida feita em um eletrocardiograma, podendo levar a parada cardíaca. Ainda lembrando que quando compramos uma medicação sem indicação correta, outros que fazem uso dela não a encontrarão disponível”.

Para finalizar, a médica diz que estamos diante do desconhecido e que não podemos arriscar ainda mais nossa saúde com a automedicação. “A única forma de reduzir riscos é cuidando da saúde com uma boa alimentação, prática regular de exercícios físicos, melhorando o bem-estar mental e seguindo as orientações das autoridades. A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou que, em pessoas não pertencentes ao grupo de risco, a obesidade é o maior fator predisponente para evolução da forma grave da COVID-19”.