Você já ficou com a sensação de que todos seus amigos nas redes sociais estavam bêbados numa quinta-feira? Pelo Facebook, todo mundo no happy hour. No Instagram, taças de vinho erguidas com a legenda: “Eu mereço!”. A naturalização do álcool é tão comum na cultura brasileira que, dificilmente, associamos essas fotos com o uso de drogas, já que a imagem do alcoólatra comum são as de pessoas que bebem todos os dias da semana e que chegam a destruir laços familiares em troca do vício. Esse conceito, porém, já é considerado ultrapassado.
A dependência de álcool leva em conta muitos fatores, entre eles o descontrole quando se começa a beber. Se a pessoa só bebe uma vez no mês, mas bebe até cair ou se toma uma ou duas taças de vinho à noite, mas faz isso cinco noites por semana, ela pode ser um alcoólatra funcional. “Algumas pessoas bebem para melhorar a autoestima ou resolver um problema que julga ter, seja timidez, falta de sono, ânimo, etc. Esse ‘beber para alguma coisa’, acaba levando à dependência química de álcool, que traz vários problemas. Primeiro é que não resolve a dificuldade inicial. Segundo é que para resolver a dependência, ela passa a precisar do álcool”, esclarece Frederico Garcia, psiquiatra e professor do departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina da UFMG.
Depois de alguns arrependimentos por ter bebido demais, a jornalista americana Sarah Hepola confrontou seu alcoolismo no livro “Amnésia: lembrando as coisas que eu bebi para esquecer” lançado pela editora Grand Central. Nele, ela detalha sua relação com o álcool. “Durante anos, fui a festas jurando que ia tomar só um drinque, mas voltava para casa depois de oito. Meu corpo respondia ao álcool de forma diferente das outras pessoas. Tenho amigos que ficam derrubados depois de dois drinque e dizem chega. Nunca entendi”, narra em um trecho.
“O tipo de consumo considerado mais perigoso é quando a pessoa ingere num curto tempo uma quantidade grande de álcool. Sobretudo, quando ela não tem o hábito de beber. A pessoa acaba pagando um preço alto por isso. Existe um questionário chamado CAGE (ver box) que auxilia nessa identificação”, explica Frederico.
No dia 30 de agosto, o aposentado Sousa*, 58, completará 13 anos sem beber álcool. Ele começou com 12 em clima de brincadeira com os primos. “Quando viajava com a família, os pais iam na frente e os primos e eu íamos mais atrás. Bebia martini e achava gostoso”. O excesso persistiu. “No meu primeiro emprego com carteira assinada, tinha 14 anos e achei que era o rei do mundo. Comecei a beber sem medo de esconder”. Um ano após o divórcio e o sentimento de solidão, ele parou de vez com a ajuda dos Alcoólicos Anônimos (AA).
Uso controlado
Existem pessoas que defendem a ideia do uso controlado de drogas, Frederico é cético quanto a isso. “Essa visão tem dois problemas. O primeiro é muito simples, a gente nunca sabe quem vai se tornar dependente e quem não vai. Segundo, diferente dos estudos do passado que suspeitavam dos danos do álcool, hoje temos certeza que qualquer quantidade pode trazer malefícios. Desde uma simples ressaca, um acidente ou mais de 300 doenças”, diz. Segundo o especialista, quando a pessoa tentar parar e não der conta, deve procurar ajuda de um psiquiatra.
*A pedido, apenas o sobrenome do entrevistado foi usado.