Esperança é, conceitualmente, um sentimento de confiança e de visualização da possibilidade de realizarmos aquilo que esperamos. Todos temos nossas esperanças pessoais e coletivas. As primeiras, além de alimentadas essencialmente pelos nossos próprios esforços e dedicação, são influenciadas também pelo cenário político. As segundas são a influenciadas muito mais pelo contexto político, em função da sua própria característica.
Nossa esperança, a esperança do brasileiro comum, vem há muito, sendo testada e, ao longo das últimas décadas, exaustivamente esgotada. Talvez, o termo mais adequado seja: irresponsavelmente subtraída.
Retrocedendo só um pouco na nossa história, constatamos um estimulado crescimento do nosso país durante o governo militar. Mas esse crescimento acaba sendo afetado pela crise internacional do petróleo de 1973, levando o Brasil a uma grave crise. A pressão social por equilíbrio econômico e pelo fim do cerceamento da liberdade batia de frente com a vontade coletiva de dias melhores. Mas havia esperança.
Muito embora esse sentimento de esperança tenha sido colocado em xeque, o brasileiro começou a reacendê-lo entre o final da década de 70 e meados da década de 80, indo às ruas pelas Diretas Já, quando Tancredo Neves, apesar de indiretamente, foi eleito presidente, com a tarefa de consolidar a democracia no chamado sexto período da República. Tancredo não chegou a assumir em função do seu falecimento, sendo sucedido por José Sarney, que apesar de ter concluído o processo de democracia e inaugurado a Constituição de 1988, submeteu o país a índices de inflação insuperáveis e a três grandes choques econômicos: Cruzado I e II e Plano Bresser. Mais uma vez nossa esperança era colocada à prova.
Essa combalida esperança não morria. Com a crise econômica, mas com a conquista da Constituição Cidadã reafirmando a democracia, e com a iminente primeira eleição direta pós-ditadura, nosso Brasil se enche, de novo, de esperança e traz de Alagoas o símbolo dos novos tempos, Fernando Collor, que se elegeu pela égide da senha “Marajá”, palavra que simbolizava os funcionários públicos com salários escandalosos. Com o novo governo, estes seriam banidos pela moralidade que se instalaria em Brasília. Com esse discurso, Collor derrota um furioso operário – Lula. Assim, a esperança do brasileiro, de novo, se apresentava. Com 2 anos de governo, Collor teve seu impedimento decretado pelo Congresso, por envolvimento em casos de corrupção. O povo volta às ruas, dessa vez com o movimento dos cara-pintada, que queria ver Collor fora da presidência. De novo, nossa esperança era derrubada. Desta vez, junto com Collor.
Com Itamar Franco, vice de Collor, assumindo a presidência em 1992, foi instituído o Plano Real, sob a inspiração do então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso. Moeda nova, vida nova, esperança renovada. Parecia que desta vez, tudo iria dar certo. E deu. Não pra todos. Mas, para aquele sociólogo travestido de economista. Iniciava
ali a era da Social Democracia, de FHC, Serra, Alckmin, Aécio Neves e outros tucanos de alta plumagem. FHC foi eleito e reeleito, tendo seu ciclo findado em 2003, com o Brasil mergulhado em grande descontentamento diante das enormes desigualdades sociais. Nosso saldo de esperança tendia ao vermelho.
Nossa esperança, quase esgotada, ressurge na eleição de Lula, eleito em 2003 e reeleito em 2007. O brasileiro foi recompensado por conquistas indiscutíveis para o país, entre elas a redução da inflação de 12,5% para 4,3%; o salário mínimo tendo aumento real de 74%, o maior em 40 anos; o pagamento de toda dívida com FMI; as exportações tendo um aumento significativo de 230%, bem como a elevação de nossas reservas; a redução visível da concentração
de renda e das desigualdades sociais; a geração de 15 milhões de empregos formais e a taxa de desemprego caindo de 10,8% para 6,8%, além de expressivos e importantes investimentos em programas sociais. E nós brasileiros nos enchemos de esperança, novamente.
Para suceder Lula, a presidente Dilma Rousseff foi eleita em 2010 e, reeleita em 2014, mas, afetado por forte crise econômica internacional, o Brasil viveu momentos de estagnação e, após o inicio do segundo mandato de Dilma, em meio a escândalos inéditos de corrupção, o brasileiro mais uma vez volta às ruas, reacende a esperança e surge o movimento “Vem pra Rua”, que resultou no impeachment de Dilma em 2016. Todo o processo capitaneado pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, hoje preso, por diversos atos de corrupção comprovados. Nesse momento de grande angústia para o país, assume o vice-presidente Michel Temer, representando, à época, o resto da esperança que ainda havia no brasileiro.
Mas, se não bastasse o histórico carma de desilusão, Temer não poupou competência em destruir a esperança do cidadão, tendo seu nome revelado em pesados esquemas de corrupção, associado e íntimo do ex-deputado – hoje preso – Eduardo Cunha, sendo flagrado corrompendo empresas brasileiras e, considerado por pessoa próxima – o
empresário Joesley Batista – como “o chefe da quadrilha mais perigosa do país” …
O Judiciário, com a participação do ilustre presidente Gilmar Mendes – flagrado em grampos telefônicos prestando favores a políticos envolvidos em corrupção – cúmplice na tarefa de assassinar nossa esperança, a julgar os atos de Temer, compara a vontade de justiça do brasileiro a “um raciocínio infantilizado, uma vontade infantil”.
E nós, esse povo brasileiro, assistimos a esse momento de desvalorização tangível e intangível: por um lado cresce o desemprego, sobe a desvalorização da nossa moeda, amplia a instabilidade política e econômica, propaga nosso medo, por outro lado, diminui a nossa capacidade de compra, minimiza o tamanho do nosso país e, o pior, enfraquece o orgulho de sermos brasileiros. E como resultado final e desastroso, assistimos ao roubo dos nossos sonhos e ao assassinato da nossa esperança.