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Advogado defende a liberação das drogas como uma forma de combater o tráfico

A descriminalização da maconha (cannabis) sempre gera polêmica quando é discutida: uma parte da população acredita que a droga é a porta de entrada para substâncias mais pesadas, enquanto outra defende que a liberação do consumo é a maneira mais rápida para acabar com o tráfico de drogas e o encarceramento de negros no Brasil, pois, segundo dados do relatório do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) de 2016, dos 622 mil detentos, 61,6% são negros e 28% foram condenados por envolvimento com substâncias proibidas.

Para além disso, várias pesquisas apontam o quanto o álcool e cigarro que tem o consumo legalizado são drogas muito mais pesadas que a cannabis. O estudo mais recente, publicado na Scientific Reports, subsidiária da revista Nature, mostra que o álcool é 144 vezes mais letal que a maconha.

Atualmente, há um processo no Supremo Tribunal Federal (STF) que pede a descriminalização do porte de maconha, oriundo de uma ação de condenação de um mecânico que assumiu a posse de três gramas de maconha dentro de uma cela na prisão em Diadema (SP).

Os ministros Luiz Edson Fachin e Luís Roberto Barroso já votaram à favor da liberação, porém Teori Zavascki, então membro da Corte, pediu, em 2015, para analisar melhor as cláusulas do processo e, até hoje, não houve mais nenhuma audiência sobre o assunto.

Para discutir sobre esta questão, o Edição do Brasil ouviu o advogado da Marcha da Maconha, Bruno Demétrio.

Por que você é a favor da descriminalização da maconha?

Essa é uma causa urgente, porque não são as substâncias que são proibidas, efetivamente. A medida de criminalização tem um público-alvo muito bem definido e serve para o controle deles: pessoas da periferia, negras e pobres, ou seja, quem mais está no sistema prisional. Essa medida, que se apresenta como sendo de segurança pública, serve para esse fim desde que foi criada. Por exemplo, no Ocidente, o primeiro local a proibir a maconha foi a Câmara Municipal do Rio de Janeiro, que o fez na época da abolição da escravidão. Neste mesmo período, a capoeira e o candomblé também tornaram-se ilícitos. Ou seja, os negros eram livres, mas não podia professar a sua religião e nem a sua cultura.

Por isso, a medida de criminalizar a maconha é higienista, racista e não se presta para o que aparentemente é colocado.

Você tem a mesma opinião em relação à outras drogas?

Penso a mesma coisa no que diz respeito às demais substâncias proibidas, pois essas políticas não servem à saúde pública. O crack é proibido porque querem cassar um determinado grupo de pessoas e criar uma vigilância militar sob elas. Se essa proibição tivesse como objetivo melhorar a saúde, iriam acolher os dependentes e não os encarcerariam.

O Uruguai e Holanda, já liberam o uso da maconha. Qual a importância disso para o movimento de descriminalização no Brasil?

É fundamental ter experiências que comprovem que essa política pode ser mudada sem que todos os jovens do mundo “caiam” nas drogas. O debate sobre a descriminalização é pautado de forma muito moralista e serve a determinados interesses como, por exemplo, o das empresas de cervejas e comunidades terapêuticas.

Você acredita que estamos perto de descriminalizar a maconha no país?

O cenário político atual está muito conturbado. Houve um momento em que o STF discutiu o assunto de maneira bem avançada, porém o debate foi travado depois que um ministro “sentou em cima” do processo. Além disso, acredito que a situação tende a se agravar com a chegada de Alexandre de Moraes, pois ele tem uma visão extremamente conservadora e a sua postura não é por acaso. O novo ministro tem um objetivo muito claro e que servem a interesses não transparentes.

A criminalização é vantagem, inclusive, para o tráfico de drogas. Para os traficantes, quanto maior a pena, maior o valor de revenda da substância, ou seja, maior o lucro. No Legislativo temos uma das Casas mais conservadora da história do país. Então, esperar algum avanço nesse poder vai ser complicado, justamente pelas pautas moralistas que vêm das bancadas que fortalecem a criminalização, como a dos evangélicos, ruralista e da bala.

Como a descriminalização da maconha pode ajudar a combater o tráfico?

Primeiro vamos mostrar que essa pauta não precisa ser “demonizada”. Quando começa a se a discutir sobre esse tema, a pessoa que puxou o assunto já está errada. A partir da descriminalização da maconha, que é um assunto mais palpável, conseguiríamos avançar mais neste debate.

A questão do tráfico de drogas no Brasil é a maior e mais cativa ameaça a soberania do país. Estamos vendo a situação de vários presídios e de facções que perturbam e, enquanto estivermos com esta política retrógrada, a perspectiva é de que isso só aumente e prejudique ainda mais o desenvolvimento institucional do nosso país.