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Casos de violência contra idosos crescem mais de 82% durante a pandemia em MG

Só no primeiro semestre de 2020 tiveram 5.963 ocorrências desse gênero, enquanto que, em 2019, foram 3.202 | Foto: Reprodução/Internet

Os casos de violência contra os idosos cresceram durante a pandemia em Minas Gerais. Só no primeiro semestre de 2020 tiveram 5.963 ocorrências desse gênero, enquanto que, em 2019, foram 3.202. Os índices seguem uma tendência nacional. Estima-se que, no Brasil, esses episódios tenham crescido 90%, saltando de 21.749 em 2019 para 41.547 em 2020. Essas informações foram levantadas pela pesquisadora Fabiana Martins Dias de Andrade, da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com base na análise de vários canais de denúncia.

A advogada especializada em Direitos Humanos, Cida Vidigal, explica que a pandemia gerou um ambiente mais propício à violência do idoso. “E nem sempre ela é física. A maioria dos casos envolve a utilização do cartão de crédito deles, por exemplo, ou em empréstimos e transferência de prioridades. Eles se transformam em escravos dos próprios filhos no que se refere à obrigação de sustentá-los e, dessa forma, são agredidos para que o façam. Ou seja, o cenário que já era ruim piorou ainda mais no contexto pandêmico”.

Ela esclarece que a violência pode ocorrer em diversas circunstâncias, desde as mais sutis até o atraso em cuidado de higiene pessoal do idoso. “Isso pode se estender no descuido em fornecer alimentação de boa qualidade e medicação correta; até aos atos mais graves, como maus tratos por violências físicas, psicológicas e sexuais; abandono assistencial, emocional e financeiro; abusos financeiros, como usurpação do benefício (aposentadoria) e obtenção de empréstimos (consignados em instituições financeiras), entre outros”.

Segundo Cida, no que se refere a ambientes privados, no Brasil, temos muitos registros de abandonos, violências físicas, psicológicas e endividamento do idoso por seus familiares mais próximos. “Estudos indicam que entre 5% e 10% deles sofrem tipos de abuso que não geram lesões no ambiente familiar ou na comunidade. No espaço público, eles são vítimas de violência verbal devido à intolerância de alguns mais jovens; nos transportes públicos, pela falta de gentileza e atenção e nas ruas estão mais vulneráveis a acidentes”.

Aposentado, o engenheiro Ademir Trindade, 71, infelizmente, está dentro desse índice. Ele relata que já passou por diversas situações, mas que duas foram mais marcantes. “A primeira foi quando eu dei a um sobrinho o meu cartão de débito para que ele comprasse alguns medicamentos pra mim. Ele desapareceu no fim de semana e, quando voltou, descobri que havia gastado R$ 1.300 em bares e outros lugares. Fiquei triste, pois confiei nele. Não quis denunciar, mas um dos meus filhos comprou a briga e conseguiu que ele me devolvesse a quantia. Outra foi no Centro de BH. Precisei ir resolver uma pendência no banco e uma pessoa esbarrou em mim e acabou me derrubando no chão. Não parou para ajudar. Sei que ando mais devagar pela idade, mas nada justifica a humilhação que passei”.

Para ele, isso acontece por inúmeros fatores. “As pessoas estão frias e egoístas. Além disso, existe um imediatismo que muitos de nós não conseguem acompanhar. Nós, idosos, estamos no momento de desacelerar. É preciso entender isso e respeitar. Valorizar os idosos, é valorizar o passado”.

Cida acrescenta que não há respeito à velhice no Brasil. “Valoriza-se muito a juventude, em detrimento das experiências vividas pelos mais velhos. Somos um povo sem memória e isso nos priva de sermos gratos aos que pavimentaram os caminhos para a sociedade que hoje temos. Para mudarmos esse cenário, é preciso olhar para os idosos como sujeitos que ainda podem nos ensinar, sermos tolerantes e respeitosos”.

Como denunciar

A delegada Marcelle Bacellar, titular da Delegacia Especializada em Atendimento à Pessoa com Deficiência e ao Idoso, reforça que qualquer pessoa pode denunciar a violência. “É dever de todos nós zelar pelo bem-estar e segurança dos idosos. No momento da denúncia, não é preciso provas. A Polícia Civil irá investigar o caso e todos os envolvidos serão ouvidos. Poderão ainda ser feitos exames de corpo de delito, além de exames periciais que possam comprovar a violência”.

A delegada acrescenta que há punições ao agressor. “Os crimes contra idosos estão previstos no Estatuto do Idoso e podem ter penas de detenção ou reclusão e variam entre 6 meses a 12 anos, dependendo de cada crime”

Consequências

Independentemente do tipo, a violência contra a pessoa idosa deixa consequências. A psicóloga Marli Cunha elucida que, pelo aspecto da vulnerabilidade de inúmeros idosos, percebe-se que, em alguns casos, sua capacitação física, intelectual e emocional está diminuída. “Por vezes, fragilizados e com a presença de sintomas físicos de depressão ou de episódios depressivos”.

Segundo a especialista, houve ainda um aumento de ocorrências relacionadas a transtornos de ansiedade diante das inúmeras mortes ocorridas nesse período de confinamento. “Idosos que tinham uma vida prazerosa e repleta de atividades, passaram a ficar temerosos de sair. Outros sequer saem como antes para evitar sofrem algum golpe ou violência. Mas também tem uma parcela que já superou essas situações e retomou a vida com maior cautela”.