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Felicidade do brasileiro caiu, enquanto a raiva aumentou

Um ano e meio depois da chegada do novo coronavírus no país, o brasileiro está menos feliz, mais estressado e com a renda achatada. É o que mostra a pesquisa “Bem-Estar Trabalhista, Felicidade e Pandemia”, realizada pela FGV Social, centro de políticas sociais da Fundação Getulio Vargas, que mede os indicadores subjetivos das emoções da população e nos compara ao restante do mundo.

De acordo com o estudo, a nota média de satisfação com a vida caiu 0,4 pontos em 2020, chegando a 6,1, o menor ponto da série histórica desde 2006. Já a desigualdade, medida pelo chamado índice de Gini, subiu três centésimos. Conforme o estudo, o novo recorde é considerado “um grande salto de desigualdade”.

O filósofo e professor universitário Marcelo Galuppo explica que apesar da felicidade não ter fórmula, algumas condições a afetam diretamente. “Estudos indicam que insegurança, desemprego e luto são os três fatores que interferem de modo mais negativo nessa percepção e os três estão combinados no caso da pandemia. Com 510 mil mortos e o governo federal trabalhando contra a erradicação do vírus, fica difícil ser feliz”, resume.

Se por um lado não estamos felizes, também estamos mais estressados. A sensação de raiva da população subiu de 19% em 2019 para 24% em 2020, uma mudança de 5 pontos percentuais (p.p.). No mundo, este avanço foi de 0,8%. Ou seja, a raiva aumentou 4,2 p.p. a mais no Brasil durante a pandemia que no resto do mundo. Preocupação, estresse e tristeza subiram, respectivamente 3,6, 2,9 e 2,2 p.p. a mais no país do que no resto do mundo. Todos indicadores subjetivos de bem-estar pioraram mais aqui na pandemia que a média dos 40 demais países avaliados.

Os efeitos desses sentimentos são muitos. “Para o corpo significa a precipitação das doenças em predisposição e as psicossomáticas. Para a mente também. Os quadros disfuncionais e transtornos mentais possivelmente estão aumentando ou podem aumentar”, afirma a psicóloga Sônia Estaquia.

Renda caiu

Se “Dinheiro não traz felicidade” como diz o ditado, pelo menos, aumenta o bem-estar. No primeiro trimestre de 2020, a renda média alcançava o maior ponto da série de R$ 1.122 e, em menos de um ano, caiu 11,3% chegando a R$ 995, primeira vez abaixo de um mil reais mensais.

“A perda de empregos além de baixar a autoestima, aumenta os estados de medo e diminui o ganho de dinheiro. Tudo isso é necessário para a sensação de alegria”, diz Sônia.

Galuppo exemplifica. “A relação entre renda e ser feliz é complexa. Existem muitos estudos que mostram duas coisas. A primeira é que, em alguma medida, o dinheiro tem um impacto positivo na percepção da alegria. Uma família americana que ganha US$ 75 mil é muito mais feliz que uma família cuja renda seja US$ 55 mil. Porém, um lar da Califórnia que ganhe US$ 95 mil não é muito mais feliz do que aquele que ganha US$ 75 mil. Isso significa que existe um platô acima do qual o ganho é marginal, ou seja, não interfere na alegria. Além disso, esse valor não é o mesmo em todo o mundo, varia de sociedade para sociedade. Em Monterrey, no México, por exemplo, é de US$ 5 mil por ano. No caso do Brasil, é provável que a queda da renda tenha um impacto muito negativo sobre a felicidade”.

Ser feliz no caos?

Mesmo com tanta notícia ruim, procurar ser feliz é inerente ao ser humano e, mesmo no caos, é preciso tentar alcançar algum nível de alegria. Galuppo e Sônia concordam em um ponto: fique menos on-line.

“Assim como fazemos assepsia do corpo e dos ambientes, devemos fazer com a mente. Primeiro em relação à comunicação e noticiários, procure consumir conteúdo que entretenha. Dormir e alimentar-se bem, trabalhar bastante, quando tiver, manter a vida afetiva sexual prazerosa. Falar com amigos, melhorar o relacionamento familiar e trabalhos voluntários também ajudam”, indica Sônia.

Já Gallupo é mais direto: desligue o celular. “Acho que o fator mais importante é cultivar relacionamentos pessoais profundos. Além disso, se a gente é impactado pelas notícias ruins da pandemia, devemos reduzir nossa exposição a elas. De novo, a dica é se desconectar do smartphone, que tem um efeito muito negativo sobre o ser humano, porque ele faz com que a gente não esteja nem ausente, nem presente. Pense no dia mais feliz de sua vida: duvido que você tenha passado esse momento cutucando a tela do computador. Além disso, evite dívidas, não saia comprando coisas na internet, porque as contas interferem negativamente sobre nós. Faça caminhadas e tome sol. Finalmente, o mais importante: use máscara, higienize as mãos, mantenha distanciamento social e convença as pessoas que você ama a fazerem o mesmo. Já morreu gente demais no Brasil”, finaliza.