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Vivendo o luto: qual a melhor maneira de passar por esse doloroso processo?

Ana Teresa Marzolla

A perda de um ente querido é uma situação difícil que todos terão que enfrentar algum dia. No entanto, muitos têm receio de falar sobre uma condição que é comum a todos: a morte. O fato é que quando ela chega, viver o luto é um processo que as pessoas passarão a fim de amenizar o sofrimento gerado pela ausência do outro. Algumas perguntas são inevitáveis como “por que aconteceu comigo?”, “quando conseguirei superar esta dor?” e “como passar por esse momento? Para compreender essas questões, conversamos com Ana Teresa Marzolla, psicóloga especialista em luto, capacitada em cuidados paliativos e tanatologia.

Por que as pessoas não gostam de falar sobre a morte?
É uma herança cultural ocidental. Isso acontece porque falar sobre isso faz com que as pessoas se defrontem com uma dor e um sofrimento muito grande, afinal, ninguém deseja perder alguém que ama. Também não queremos pensar na nossa própria finitude. Nós não sabemos quando vamos perder alguém ou quando vamos vir a óbito. Alguns acreditam que conversar pode atrair a morte. Na realidade, quanto mais dialogar melhor para quebrar a ideia antiquada de que a gente não consegue se preparar para o falecimento de maneira nenhuma.

Como é possível lidar com o luto?
O luto é muito singular e cada um vive esse momento de uma forma diferente. Isso também pode variar de intensidade dependendo da pessoa. Ele é uma reação à perda e tem uma conexão direta com o vínculo que estabelecemos com quem amamos. Quanto mais proximidade e dependência emocional, maior será o sofrimento durante o processo.

A memória de como esse óbito aconteceu em algumas situações é bastante traumática. Em outras é um adoecimento que vem de muito tempo. Em geral, os primeiros momentos são voltados para refletir sobre o que aconteceu. Quando nos questionamos isso, percebemos que os indivíduos que têm dificuldade de entender a morte também têm problemas para lidar com o luto. Alguns ficam extremamente revoltados, enquanto outros muito tristes.

É preciso identificar o que foi perdido para poder reorganizar a vida. Às vezes não é somente a presença física, mas também a segurança que o ente querido representava, companhia constante e com quem compartilhava as decisões ou alguém que era o sustento da casa. Feito isso, vamos nos encaminhando para a etapa final da elaboração do luto em que consigo identificar formas de viver com a lembrança e com a saudade já sem tanta dor e sofrimento, recordando de quem essa pessoa era e não apenas pelo fato de ela não estar mais aqui.

A dor da perda ameniza com o tempo?
Isso é variável, mas alguns diagnósticos médicos limitam entre 2 meses a um ano. Eu como psicóloga, que atende exclusivamente enlutados, vejo que alguns podem demorar mais e outros menos, dependendo do quanto o indivíduo se permite viver essa dor no momento. Às vezes não quer se entregar para esse sofrimento logo no começo e isso se acumula, o que não significa que o luto dele é muito complicado, mas sim que precisou de um prazo maior para passar por essa situação.

Quando é a hora de procurar ajuda profissional?
A ajuda profissional é válida desde o início. Inclusive, atendo pacientes com prazo de 15 dias após o óbito. É importante que tenha um espaço para falar da sua dor, o que muitas vezes dentro da própria família não é possível. Isso porque como o luto é singular, cada um vive de uma maneira diferente. Alguns querem conversar, enquanto outros preferem se guardar. Ter um médico para auxiliar e dar um suporte nesse momento pode fazer com que o processo se resolva mais cedo.

O que fazer com os pertences do(a) falecido(a)? Quanto antes se livrar deles melhor?
Não existe uma regra para isso. Algumas pessoas preferem se desfazer dos itens logo após voltarem do velório. Mas já vi muitos se arrependerem depois, pois ainda precisavam um pouco mais daqueles objetos ou gostariam de ter guardado algo específico. Eu sempre sugiro aos meus pacientes que escolham um pertence para manter e que traga uma boa recordação.

Se desfazer dos artigos requer que o indivíduo esteja preparado e isso não tem um prazo. O ideal é fazer isso gradativamente. Mexer nesses objetos é muito difícil, uma vez que provoca lembranças constantes e causa emoções. Se a família puder participar disso juntos e dando suporte uns ao outros também é melhor para superar e conseguir eliminar os pertences. O que não é saudável é que a pessoa mantenha os objetos em casa e fique manipulando o tempo todo.

Como preparar alguém para a possível morte de um familiar?
É necessário identificar que a pessoa aceita a ideia de que o outro pode falecer. É natural que tenhamos um período de negação quando se trata de alguém que a gente ama e não quer perder. Se o familiar não entende, qualquer palavra contrária não será absorvida, pois ele não acredita que a morte pode chegar. Se o indivíduo tem consciência e está conformado, o essencial seria aproveitar os últimos momentos. É preciso entender que ainda há algum tempo, pensar o que gostaria de fazer, resolver os conflitos que talvez estejam pendentes. Esse último é importante para que não fique nada inacabado e que ele também possa ser um suporte e um conforto para quem está em estado terminal ou partindo. Nós podemos conseguir fazer isso com um olhar muito bonito desde que a gente aceite que a morte vai acontecer.

Como consolar alguém que perdeu um ente querido?
Primeiro é preciso ouvir sem querer impor a nossa forma de viver um luto. Digo aos meus pacientes que independentemente do que eles façam, sempre terá alguém para criticar e elogiar. A pessoa em luto fica confusa com as considerações externas. Por isso, a nossa opinião só deve ser dada quando for solicitada. Não precisa dizer nada, basta abraçar e estar presente, afinal, os gestos são mais importantes do que as palavras nesse momento. Também é preciso tomar cuidado com as ponderações com relação à religiosidade. No mais, o certo a fazer é escutar, acolher e se colocar à disposição. Se ofereça para fazer uma compra, resolver a burocrática documentação, buscar ou levar um filho na escola. O enlutado precisa entender que pode contar com você.