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COVID-19: como a lei assegura os trabalhadores em meio a pandemia?

A COVID-19 tem interferido diretamente no mercado de trabalho. Muitas empresas em todo o país têm adotado ao regime de home office, que é quando o trabalhador exerce sua função de maneira remota, em casa. Contudo, nem sempre é possível desempenhar as atividades fora do ambiente de trabalho. Por isso, algumas companhias têm buscado formas de liberar os funcionários, seja por meio de acordo ou férias coletivas.

Mas existe uma lei que assegura o trabalhador em uma situação como essa? Para saber mais sobre o tema o Edição do Brasil conversou com o advogado Tiago Valadares (foto), que é pós-graduado em direito do trabalho e especialista em direito do trabalho empresarial. Ele explicou sobre faltas, home office, direito dos pais cujos filhos estão em casa sem aulas e outros assuntos acerca das adaptações devido à pandemia do coronavírus.

Há alguma legislação especial para o coronavírus?
Do ponto de vista trabalhista, aguarda-se para os próximos dias uma Medida Provisória (MP) ou Projeto de Lei (PL) que já foi parcialmente anunciado pelo governo federal, relacionada à eventual redução de jornada combinada com diminuição salarial, supressão do prazo prévio para aviso das férias, suspensão da comprovação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); dentre outros.

Até então, existe a Lei 13.979/20, que dispõe “sobre as medidas que poderão ser adotadas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus”. Essa legislação não possui natureza e efeitos tipicamente trabalhistas, à exceção da instituição da “falta justificada” para os “afetados pelas medidas previstas” na lei. A falta justificada só se aplicaria se, antes de qualquer determinação governamental para fechamento ou inviabilidade da atividade, o empregador não tiver adotado nenhuma outra medida como home office ou férias, por exemplo.

Se o funcionário tem os sintomas, não consegue atendimento, mas fica em isolamento uma vez que essa é a orientação médica em casos suspeitos, a empresa pode descontar os dias dele?
O empregador deve oferecer medidas de segurança de trabalho para o empregado, sendo recomendado observar a prevenção indicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), dentre elas, o isolamento de pessoas com sintomas da COVID-19, adoção de formas de higiene, preservação do grupo de risco; etc. Ao adoentado é garantida a falta justificada mediante atestado médico.

Legalmente, a falta justificada depende do atestado, não servindo a lei citada na primeira pergunta, sem uma determinação específica ou genérica para o caso, como justificativa para toda e qualquer falta. Por outro lado, há que se observar a segurança, inclusive dos demais empregados. É importante ter bom senso.

A empresa pode exigir a presença dos empregados no local de trabalho ainda que eles se recusem a comparecer por medo da contaminação?
O empregado não pode se recusar a trabalhar fisicamente no posto de trabalho, salvo alguma vedação legal, exposição eminente e evidente de risco ou impossibilidade do trabalho por alguma restrição de acesso, por exemplo.

Ao trabalhador é garantido o ambiente seguro, o que inclui medidas de segurança sanitárias. O empregador deve adotar as normas de restrição que já são comuns em alguns setores, bem como todas as indicações das autoridades sanitárias. De toda forma, quando possível, opta-se pelo home office ou indicação de férias, banco de horas, dentre outros. Hoje, não há, legalmente, uma autorização genérica para a suspensão de todo e qualquer trabalho.

Que direitos têm os pais de crianças menores de 12 anos que tiverem que ficar em casa devido à suspensão das atividades escolares?
Pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a suspensão das aulas não autoriza a falta justificada. Pode haver alguma negociação entre as partes nesse sentido, porém, não se trata de uma imposição legal. Há quem diga que a Lei 13.979/20 autoriza e reconhece tal período como falta justificada, entretanto, não concordo com essa interpretação.

Caso a empresa solicite que o empregado trabalhe de casa, ele pode se negar?
O home office que está sendo feito de forma ordinária neste período de crise não é propriamente o estabelecido pela Reforma Trabalhista, ou seja, não se trata de um formato contínuo de prestação dos serviços. Trata-se de uma possibilidade temporária, sem a conversão perene ou adquirida para o regime próprio do home office. Entendo que se a modalidade for possível na prática, salvo algum decreto de impedimento do trabalho ou causas de suspensão ou interrupções prévias do contrato, não cabe a recusa do empregado, resguardando-se os direitos do contrato original. Recomenda-se estabelecer as formas de prestação desses serviços como custos, jornada, obrigações e formas do trabalho.

No caso do home office, a empresa deve fornecer infraestrutura para que o funcionário consiga desempenhar sua função de casa?
Os custos adicionais e equipamentos devem ser convencionados entre as partes. Pode, inclusive, haver a indicação de que o empregado usará seus próprios meios, utilizando suas despesas ou vice e versa.

A empresa pode dar férias coletivas no lugar do recesso?
Não há essa previsão de recesso. Podem ser conferidas férias coletivas, desde que respeitados os requisitos legais. Salvo nova legislação em contrato, para a concessão de férias coletivas, faz-se necessário aguardar o prazo prévio de aviso ao sindicato e secretaria do trabalho de 15 dias, bem como para os próprios empregados. A referida MP ou PL, anunciada na imprensa pelo governo, ainda não publicada até então, suprimiria esse prazo prévio.

Se a empresa não optar pelas férias e pedir que os funcionários fiquem em casa, pode descontar esses dias depois?
Eventuais períodos de afastamento determinados pelo governo ou pelo próprio empregador enquadram-se como hipótese de licença remunerada (falta justificada) para os efeitos do artigo 133 da CLT, conforme vejamos: Art. 133 – Não terá direito a férias o empregado que, no curso do período aquisitivo: (…) III – deixar de trabalhar, com percepção do salário, por mais de 30 (trinta) dias, em virtude de paralisação parcial ou total dos serviços da empresa.