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Cobrança a mais na falta de moedas configura prática abusiva no comércio

O valor anunciado é de R$ 2,49 por uma pasta de dente, R$ 12,99 pelo desodorante, R$ 9,98 por um saco de balas e R$ 4,99 por um tablete de chocolate. É comum encontramos preços “quebrados” para a maioria dos produtos. O resultado disso é a dificuldade na hora do troco pela falta de moedas de baixo valor. A solução encontrada por muitos comerciantes é arredondar o preço para mais ou devolver em balinhas e similares no lugar do dinheiro. No entanto, a prática é ilegal e pode trazer problemas ao estabelecimento.

O advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Igor Marchetti, ressalta que a cobrança a mais, mesmo que por poucos centavos, configura prática abusiva por parte do estabelecimento. “Isso está previsto no artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor. O valor sempre deve ser arredondado para baixo até que a empresa tenha o troco. Isso porque o consumidor não pode ser onerado a mais do que o fixado no preço”.

Outra prática comum dos estabelecimentos é oferecer chicletes, balas e similares quando não tem troco. “O consumidor não pode ser obrigado a aceitar esse tipo de manobra. Caso se sinta prejudicado, poderá reclamar no Procon para que sejam tomadas medidas administrativas contra o estabelecimento, como multa ou, em casos mais graves, até a suspensão da atividade”.

Para Marchetti, o preço é quebrado por conta da especificidade do produto. “Um bom exemplo é o combustível, em que a diferença de centavos por litro impacta no valor final da compra, sendo um diferencial de escolha para os consumidores. Entretanto, na maioria dos casos, o desconto é mais um chamariz de marketing”.

O advogado salienta que não existe regulamentação específica relacionada aos valores quebrados. “A fixação de preço dos produtos é mera liberalidade do fornecedor. Apesar dessa premissa ser um direito da empresa, também é responsabilidade dela providenciar quantias pequenas para que o consumidor receba o troco sem a necessidade de arredondamentos”, esclarece.

Na visão do economista Leandro Martins, os comerciantes utilizam preços quebrados como um efeito psicológico. “Isso cria a sensação de que a tarifa do produto é menor do que realmente custa. Um saco de balas, por exemplo, cujo o preço seja R$ 9,98, na prática acaba ficando por R$ 10, pois o estabelecimento não terá a moeda para fornecer o troco. Quando o cliente é perguntado sobre quanto pagou, sempre tende a falar que custou R$ 9 e alguns centavos”, afirma.

Ainda segundo o economista, muitas vezes, o cliente sente vergonha de reclamar por poucos centavos. “Eles precisam levar em conta que, de pouco em pouco, o prejuízo no final pode ser maior do que imaginam. No entanto, esse problema tende a ser cada vez menor com o avanço das compras com cartão de crédito e débito”.

Márcia Oliveira, proprietária de uma papelaria, diz que já teve problemas por não devolver o troco correto. “Esses preços quebrados são essenciais, mas também dificultam pela falta de moedas. As de 1 centavo são raridade. Quando o valor a devolver era entre 1 a 4 centavos, sempre arredondávamos para mais, pois muitos clientes não fazem questão por ser uma quantia pequena. Porém, já tivemos alguns que quiseram receber o troco e precisamos devolver a mais. A gente entende que essa é a atitude correta a se tomar”.

Cadê as moedas?

As moedas de 1 centavo continuam tendo valor legal, mas não estão mais sendo mais fabricadas. De acordo com o Banco Central (BC), o motivo é que elas têm um valor muito baixo e um custo de produção alto. Em 2004, ano em que as últimas moedas de 1 centavo foram cunhadas, a Casa da Moeda emitiu 3.191.259.000 unidades.

O entesouramento é outro fator que contribui para a escassez. Um levantamento feito pelo BC revelou que um terço das moedas emitidas está fora de circulação. Isso acontece porque os brasileiros ainda mantêm o hábito de guardar, principalmente as de pequeno valor, seja em cofrinhos, gavetas ou até mesmo no carro.

Muitos podem pensar que para solucionar o problema basta o BC produzir mais moedas. O economista explica que isso não resolveria, pois o custo da fabricação de algumas é maior que o valor de face das mesmas. “As de R$ 0,05, R$ 0,10 e R$ 0,25 são as mais caras. Já as de R$ 0,50 e R$ 1, se cunhadas em larga escala podem compensar a fabricação daquelas de menor valor”, conclui.

Quanto custa emitir novas moedas?

 

Valor de face Valor de produção
R$ 0,05 R$ 308,09/milheiro ou R$ 0,30 (unidade)
R$ 0,10 R$ 403,07/milheiro ou R$ 0,40 (unidade)
R$ 0,25 R$ 496,97/milheiro ou R$ 0,49 (unidade)
R$ 0,50 R$ 409,35/milheiro ou R$ 0,40 (unidade)
R$ 1 R$ 467,70/milheiro ou R$ 0,46 (unidade)

Fonte: Banco Central/março de 2018