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Menosprezado pelo governo federal, turismo LGBT injeta mais de R$ 107 bilhões no Brasil

Você consegue imaginar um segmento que injeta US$ 26,8 bilhões por ano, o que representa R$ 107,2 bilhões na economia nacional, ser descartado por um país em crise econômica? O que parece uma suposição irreal, ilustra o Brasil na última semana. O governo federal retirou o incentivo ao turismo LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) do Plano Nacional de Turismo 2018-2022. Segundo a Organização Mundial do Turismo (OMT), o público gay representa 10% no turismo e movimenta 15% do faturamento do setor. E dos mais de US$ 218 bilhões movimentados por ano no mundo, o Brasil é o segundo país que mais fatura com essa parcela:  com taxa de crescimento de 0,8% ao ano. Os dados são divulgados pelo relatório global LGBT2030 da consultoria Out Now, que entrevistou 130 mil participantes em 26 países.

Para Alex Bernardes, diretor comercial da ViaG, revista de informações turísticas voltada para o público LGBT, fica evidente que o Brasil está na vanguarda desse segmento turístico. “Temos o maior número de paradas LGBT’s no mundo, são quase 200. Várias cidades consideradas LGBT friendly, como BH, Florianópolis, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Salvador, Fernando de Noronha investem em festas voltadas para esse grupo”.

O momento, no entanto, não é visto como o melhor. “É difícil porque ao mesmo tempo que temos o mercado e governos específicos incentivando a diversidade, o governo federal, na figura máxima do país, vai contra esse segmento. Fica todo mundo meio cauteloso, principalmente, o turista internacional”, avalia Bernardes.

O diretor refere-se à frase “Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade. Agora, não pode ficar conhecido como paraíso do mundo gay aqui dentro”, atribuída ao presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL). A  Câmara de Comércio e Turismo LGBT do Brasil publicou, em nota, que “combater a visita da comunidade LGBTI+ ao Brasil, além de ser um grave ataque aos direitos universais, impediria a entrada de US$ 26,8 bilhões na economia brasileira, colaborando com o desemprego e minando as relações internacionais brasileiras com países que valorizam a democracia e o fim do preconceito”.

Em Minas Gerais, a Parada LGBT 2018, rendeu à capital R$ 7 milhões em receita direta, segundo dados do Observatório do Turismo de Belo Horizonte. Os 17,2% dos turistas que desembarcaram para o evento gastaram, em média, R$ 411,03. No geral, o fluxo estimado de participantes foi de 150 mil, com o gasto médio individual de R$ 46,90.

A Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais (Secult) declarou em nota que tem se aproximado de ações relacionadas ao segmento LGBT. “Nos últimos anos, a Secult participou como ouvinte no Fórum Brasileiro de Turismo LGBT, apoiou à realização do Fórum de Turismo LGBT Minas Gerais e, em parceria com o Ministério do Turismo, Câmara de Comércio LGBT e Fecomércio MG, organizou a edição Minas Gerais do “Meeting Turismo LGBTI 2018”, que envolveu os principais players do mercado”. Segundo a secretaria, em 2019, está previsto a realização de um levantamento de dados e a continuidade das atividades juntos aos principais atores do setor.

 

Pink money

O nicho LGBT costumava ser chamado de pink money (dinheiro rosa), mas hoje, o termo é visto por parte da comunidade como ultrapassado. “Pink money é usado para descrever o poder de compra da comunidade LGBT e refere-se a toda cadeia produtiva que o segmento movimenta dentro da parcela economicamente ativa do país de origem. É o dinheiro injetado na economia por meio da comunidade”, explica Ricardo Gomes, presidente da Câmara LGBT.

Gomes esclarece que o estilo de vida é uma das vantagens do público. “A maior parte da população LGBT é formada por casais que não têm filhos, então eles têm um poder de investimento e consumo para todos os segmentos maior que a média do público heterossexual, principalmente em turismo, alimentação, lazer, entretenimento e automotivo. Além disso, é um público bastante exigente, principalmente o homem gay, que investe em valor agregado no produto e no serviço. Não é que a população heterossexual não invista, mas essa é uma característica do segmento”, diz.

Quanto mais, melhor

Para Gomes, o segmento LGBT está aberto a empresas que querem atingir esse público, mas não de qualquer jeito. “A primeira coisa que um empresário ou uma empresa precisa fazer é se atentar para conhecer um pouco mais essas pessoas, você não consegue atender o seu cliente sem saber quais são seus desejos, necessidades e especificidades”, diz.

E alerta que o público está atento às tentativas de pinkwashing, prática de usar a bandeira como estratégia política, de marketing ou até financeira, mas não colocar o discurso em prática. “Existem marcas muito bem posicionadas e que sabem exatamente como atingir esse público com qualidade, mas a maioria não tem esse conhecimento e muitas acabam lançando campanhas, produtos ou serviços em que ‘o tiro sai pela culatra’. Se quer atingir esse público, faça sua lição de casa”, avisa.