Home > Geral > 5,5 milhões de crianças não têm nome do pai no registro

5,5 milhões de crianças não têm nome do pai no registro

“Pai não declarado”. É essa expressão que aparece na certidão de 5,5 milhões de crianças no país que não têm a paternidade reconhecida. Mas, em muitos casos, o nome não significa presença. Segundo a Data Popular, existem 67 milhões de mães no Brasil, sendo que 31% (20 milhões) são solo. Os dados mostram uma realidade comum: a facilidade que os homens têm em optar por ser ou não responsável pelo filho.

A psicóloga Luisa Conrado explica que isso é reflexo do machismo enraizado em nossa sociedade. “A mulher só é vista com a função de ser mãe, enquanto que o homem pode fazer o que quiser, inclusive escolher não ser pai. A paternidade soa como opcional porque é comum eles deixarem para a mãe o encargo de cuidar, educar e estar presente”.

Segundo a psicóloga, a ausência paterna pode trazer consequências. “Esse distanciamento gera um sentimento de rejeição profundo na criança e ela pode levar esse registro para outros relacionamentos, tendo, até mesmo, dificuldade em criar laços”.

De acordo com Luisa, muitas mães acabam por exercer a tarefa de criar um filho sozinha. “A muito custo, claro. A criança cresce achando a falta paterna normal. E isso pode fazer com que ela repita esse padrão. Ela acrescenta que, contudo, a figura masculina. “É diferente ter um pai biológico e ter uma figura paterna. Ela pode ser substituída de várias formas na criação”.

Foi o que aconteceu com a professora Larissa Villani. Apesar de não pertencer à estatística de crianças sem o nome do pai declarado na certidão, ela cresceu sem a presença paterna. “Quando completei um ano e meio eles se divorciaram, ficou acordado que ele tinha que pagar pensão e me visitar todo fim de semana, mas ele apareceu só duas vezes e nunca pagou a pensão”.

Ela recorda que, quando criança, era bem resolvida em relação à ausência masculina. “Eu entregava os presentes das festinhas de Dia dos Pais para o meu avô ou para meu tio. Eles sempre foram muito legais comigo e me tratam com maior respeito e admiração. Mas nenhum dos dois era meu pai. Chegou um momento que eu comecei a enxergar a minha mãe como meu pai”. No entanto, quando foi amadurecendo, percebeu a diferença. “A gente começa a entender o que é a relação pai e filho e você sente falta. Eu queria um herói, um cara que me amasse e me protegesse de todo mal, bem aquela figura romantizada”, revela.

O sentimento veio forte quando chegou o dia de seu casamento. “A noiva entra com o pai e eu me toquei de que isso não aconteceria comigo. Fez falta, mas não foi nada que eu não pudesse superar”.

Hoje, Larissa diz não sentir nada pelo pai. “Eu fico me perguntando por que será que fui rejeitada dessa maneira? Eu não conheço meu pai, não sei o rosto que ele tem. É difícil sentir algo por alguém que não existe. O único sentimento que eu tenho por ele é ressentimento. Não por mim, mas pela minha mãe. Ele a abandonou quando ela mais precisou”.

O que diz a lei
O advogado Marcello Rodante explica que o pai pode ser penalizado dentro de sua autoridade parental por não assumir o filho, mas não é justificado como crime. “Ninguém vai para a cadeia por não reconhecer a criança ou não ir visitá-la”.

Ele acrescenta que, quando a criança se torna jovem ou adulto, pode buscar meios legais de ter a paternidade declarada em certidão. Isso também pode ser feito pela mãe. “Nesse caso, não existe obrigatoriedade de adotar o sobrenome do pai. Mas é um direito da pessoa ter a paternidade reconhecida. Ele não pode negar o reconhecimento”.

O advogado afirma que esse é o primeiro passo para garantir outros direitos. “Se o nome não estiver declarado, não existe presunção de paternidade. O pai não vai responder por uma pensão alimentícia se não tiver a paternidade reconhecida”.
Contudo, não há como cobrar o amor das pessoas. “Existem ações baseadas em um valor afetivo, devido os pais não estarem presentes na vida dos filhos. Isso não tem necessariamente a ver com o nome, mas com a conduta do pai ao longo do tempo”, conclui.

[box title=”Você sabia?” bg_color=”#aeb7bf” align=”center”]Antes, o reconhecimento de paternidade era realizado somente via judicial através de processo apresentado a um juiz de direito, com manifestação do Ministério Público e presença de advogados. O processo, muitas vezes, levava anos para ser finalizado. Agora, o processo é mais rápido e feito diretamente em cartório. Ele pode ser feito de maneira espontânea pelo pai ou solicitada pela mãe ou filho. Em todo caso, é necessário ir ao cartório de registro civil dar início ao processo. A via judicial ainda permanece válida quando o pai se recusa a reconhecer o filho.[/box]