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“Em 2 anos do governo ilegítimo, o Brasil andou décadas para trás”

A eleição para a presidência, que acontecerá em outubro de 2018, promete ser a mais disputada e imprevisível dos últimos anos. Sem Lula (PT), candidato que aparecia em primeiro lugar em diversas pesquisas de intenção de voto, o pleito está em aberto e não há um candidato que se destaque em relação aos demais.

O Edição do Brasil conversou com Guilherme Boulos, representante do PSOL e que esteve, recentemente, em Belo Horizonte. Ele é coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) e do Povo Sem Medo, frente de movimentos que vem lutando contra medidas do Governo Temer. Além disso, Boulos é formado em filosofia e possui mestrado em psicologia.

O que te motivou a assumir uma candidatura à presidência?

Nossa entrada na eleição têm o objetivo de apresentar um projeto novo para o país, de enfrentamento aos privilégios, de redemocratização e de entender os desafios que estão sendo colocados. É uma candidatura de resistência ao golpe, mas que também tem que aprender com as lições desse período, pois não é possível reproduzir o mesmo modelo de governabilidade com os partidos que sempre mandaram no Brasil e Congresso Nacional.

A esquerda precisa ter a responsabilidade para enfrentar esse momento histórico, com uma unidade democrática. Isso expressou-se em vários momentos, como na luta pelo direito de Lula ser candidato e contra os retrocessos dos direitos durante o Governo Temer. O fato de haver diferenças políticas não nos impede de lutarmos juntos por diversas pautas, entretanto as distinções existem e não podemos jogá-las para debaixo do tapete. Aliás, o pensamento único não deve fazer parte de quem quer transformar a sociedade. A diversidade e a crítica são saudáveis e isso não pode nos impedir de sentarmos na mesma mesa quando o objetivo é maior.

Após a prisão de Lula falou-se sobre uma possível candidatura unificada entre você e a Manuela d’Ávila (PCdoB). Isso pode acontecer?

O debate que estamos fazendo, neste momento, é de unidade democrática. Se juntarmos isso com integração eleitoral, vamos afastar pessoas. Na união democrática não deve caber apenas candidaturas da esquerda e partidos políticos, mas também há espaço para setores da sociedade civil, intelectuais, artistas, figuras públicas e movimentos sociais. Precisamos entender a gravidade do momento e não colocar o “carro na frente dos bois”.

Qual é o plano para o futuro do Brasil?

Não há projeto de futuro para o país se não revertermos os estragos de Temer. Em 2 anos do governo ilegítimo, o Brasil andou décadas para trás. A Reforma Trabalhista desmontou o sistema de proteção aos trabalhadores que existia há 80 anos; a emenda constitucional 95 congelou os investimentos governamentais para os próximos 20 anos em saúde, educação, moradia e políticas sociais em diversas áreas.

Quais são as suas principais propostas para os setores de saúde, educação e emprego?

Nossa proposta é, como primeira medida do governo, convocar um plebiscito para que o povo possa decidir se quer manter ou revogar essas medidas anteriormente citadas. Agora, existem outros elementos fundamentais e um deles é o enfrentamento a desigualdade e a capacidade de investimento do Estado em saúde, educação e qualquer política pública que permita a geração de empregos e retomada da economia. Nenhum país em crise retoma o desenvolvimento apenas no setor privado, investimento público é essencial. Para que isso aconteça, é preciso repensar a forma como o Estado é financiado e isso implica impor uma reforma tributária progressista. Hoje, quem sustenta o Brasil é o pobre e a classe média, rico não paga imposto. Temos que colocar isso na mesa e fazer com eles comecem a contribuir mais.

Outra questão é o sistema político brasileiro. Podemos ter o melhor dos programas e propor todas as reformas necessárias, mas nesse sistema de governabilidade e modelo político não se faz nada Então precisamos realizar uma profunda reforma política, uma democratização do Estado e aproximação do poder em relação às pessoas. Hoje tem um abismo entre Brasília e a população. A crise de representação e a desesperança tem a ver com o sistema político, que reserva apenas o direito de apertar um botão a cada 4 anos. Isso não é democracia. As pessoas precisam ser ouvidas e participar da vida política constantemente.

Qual é o plano do PSOL para ter governabilidade?

O partido está apresentando uma chapa muito expressiva e vai aumentar, significativamente, a sua bancada. Esse Congresso está desmoralizado e esperamos que a renovação não seja apenas de nome, mas também política. Para além disso, este modelo de governabilidade se esgotou. O presidencialismo de coalizão virou um balcão de negócios e não pretendemos governar com essas alianças. Queremos nos juntar com a maioria da sociedade brasileira, o que significa mobilização, garantia de referendos e plebiscitos para que o povo possa decidir sobre questões fundamentais. O Congresso tem o seu papel, mas não pode decidir tudo. Voto não é cheque em branco. Uma reforma política de verdade significa reduzir o poder dos políticos e aumentar o das pessoas. É dessa maneira que pretendemos governar.

No que a sua formação acadêmica o ajuda na política?

No Brasil, saber psicanálise ajuda muito nos tempos atuais para se fazer política, porque ela nos ensina a escutar e a evitar certas armadilhas que, atualmente, são comuns. Existem pessoas que, por exemplo, fazem o momento de crise virar um período de insegurança e perda de perspectivas, o que estimula o medo. Aliás, o medo é um sentimento que conduz a agressividade, embora possam parecer opostos, eles são complementares. Quem teme é muito aberto a um discurso de agressividade e Bolsonaro é a maior prova disso, não só no processo eleitoral como no político.

Na sua opinião, quais candidatos devem chegar ao segundo turno?

As eleições de 2018 são as mais abertas e imprevisíveis desde 1989. Nenhuma pesquisa que saia neste momento tem como apresentar um raio-X do que vai acontecer. Lula lidera as pesquisas, há um movimento fortíssimo do Judiciário para tirá-lo do processo e a prisão dele tem a ver com isso. Nos cenários nos quais o ex-presidente não aparece, quem ganha são indecisos, brancos e nulos. É importante ressaltar que a nossa candidatura é para valer, a proposta é de disputar um projeto de país e ir para o segundo turno.