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Arbitragem: dilema entre os erros e acertos

Nosso tradicional Campeonato Mineiro de 2018, ao contrário das últimas edições, ficou marcado no último dia 18 de fevereiro no clássico entre América X Atlético por polêmicas envolvendo um personagem que tem como objetivo ser sempre coadjuvante, mas que de forma assustadora, injusta e cruel tem ganhado papel de destaque nos estádios do Brasil. Estou me referindo ao árbitro de futebol. Após a partida, dirigentes do América F. C. indignados com a atuação do assistente FIFA, Guilherme Dias Camilo, usaram dos microfones de rádio e TV presentes na sala de imprensa do estádio Independência e não mediram palavras para criticar o bandeirinha. Aliás, o próprio Presidente do América, Marcus Salum confirmou ter xingado Guilherme Camilo no túnel de acesso aos vestiários e exigiu punição severa ao assistente.

Pois bem.

Neste contexto de pura emoção, nervos à flor da pele e um desejo maciço de alcançar o objetivo traçado ao longo de uma desgastante temporada, eis que surge uma figura muito importante, que tem a responsabilidade de conduzir o espetáculo futebolístico, mediar os conflitos existentes e o mais relevante: legitimar o resultado da partida, pautado nas regras do jogo. Os “juízes” e “bandeirinhas”, assim popularmente chamados exercem uma atividade de altíssima responsabilidade, que foi recentemente reconhecida como profissão, mas que na prática revela-se amadora em meio a um esporte altamente profissional e rentável que é o futebol.

Jornalistas, cronistas, dirigentes, treinador, jogadores e milhares de torcedores apaixonados, engrossaram o coro de duras críticas e indignação contra as decisões do assistente Guilherme Camilo que validou um gol do Atlético, alegando que a bola havia ultrapassado toda a linha de meta (ou linha do gol), porém, em lance muito similar, a favor do América, não consignou o gol por entender que a bola não teria entrado por completo na meta atleticana.

Ora, com a devida vênia, após rever as imagens pela TV, por ângulos distintos, não há como afirmar com absoluta certeza que o assistente tenha se equivocado. Ademais, trata-se do melhor assistente brasileiro na atualidade, sendo premiado no ano passado durante cerimônia realizada na sede da CBF. Poucas vezes presenciei um erro deste bandeirinha, ao contrário, só ouço elogios a seu respeito.

Outro fato que me causou espécie diz respeito aos padrões de edição das imagens que chegam até o telespectador. Quando ocorre um lance de difícil definição, as TVs tem por hábito utilizarem de sua tecnologia para dirimir a dúvida suscitada. Porém, vendo as imagens dos lances polêmicos daquela partida, percebe-se que as edições, a meu sentir, não trazem a segurança devida para afirmar, repito, com a devida convicção, que a bola tenha ou não ultrapassado a totalidade da linha de gol. Neste caso, não entendo razoável crucificar o bandeirinha e imputar ao mesmo toda a responsabilidade pelo resultado final da partida, até porque, a equipe de arbitragem não dispunha do recurso tecnológico do árbitro de vídeo nem mesmo do sistema de chip implantado na bola, com sensores eletrônicos em cada um dos gols.

Neste contexto, não podemos esquecer e considerar que aquele cidadão designado para conduzir a partida de futebol é um ser humano falível, como qualquer outro, seja médico, engenheiro, advogado, magistrado, ministro e até o presidente da república, capaz de tomar mais de 120 decisões por jogo (em frações de segundo), diante de 22 jogadores, técnicos, 50, 60, 80 mil torcedores ao seu redor; estar em diversas partes do campo; assinalar impedimentos ajustados e de grande complexidade, que sequer as lentes poderosas das câmeras de TV são capazes de sanar a controvérsia apresentada naquele determinando lance do jogo.

O mais espantoso disso tudo é que a sociedade esportiva militante no futebol quer exigir dos “homens de preto”, a chamada arbitragem perfeita. Neste caso, permissa vênia, mesmo com o advento do árbitro de vídeo e todo o aparato tecnológico, impossível de acontecer. Sempre haverá espaço para as divergências, sendo salutar mantermos o alto nível das discussões, sem extrapolar os limites legais do respeito ao próximo e da boa convivência.

Nossa sociedade vive uma crise de identidade. A economia vai de mal a pior, a violência aumenta assustadoramente, os políticos cada vez mais sem credibilidade, a saúde em situação alarmante e a educação nunca foi prioridade. Diante deste universo de grandes mazelas torna-se fácil apontar defeitos e culpados. Aliás, o nosso grande problema está justamente nesta postura comodista de criticar, apontar defeitos e responsáveis, mas pouco fazer para criar soluções eficientes, capazes de mudar conceitos, comportamentos e quebrar paradigmas.

Exigir dos árbitros o acerto permanente nas decisões tomadas na condução das partidas é, no mínimo, injusto e desumano. Por que quando um goleiro falha de forma bisonha ou um jogador perde um gol feito, somos tão tolerantes e aceitamentos tranquilamente suas desculpas? Por que quando um técnico erra ao escalar sua equipe e perde o jogo, não é execrado e tem sua honra questionada? Por que um jogador que procura a todo custo burlar as regras do jogo, simulando reiteradas vezes ter sofrido uma falta é aplaudido quando consegue enganar o árbitro? Por que alguns dirigentes esbravejam diante de câmeras e microfones quando o árbitro comete um erro contra sua equipe e se calam quando o erro lhes favorece? São perguntas que não querem calar.

A ideia não é esconder os erros dos árbitros, até porque, eles existem. São reais! Mas a culpa, por incrível que possa parecer, não é só do árbitro.

As regras do futebol, em determinados tópicos são claras em dizer: “se na opinião do árbitro…” Ora, a partir do momento que a decisão passa a ser tomada levando em consideração a interpretação do árbitro, não podemos exigir que todos tenham a mesma leitura das jogadas. Concordo que, em alguns casos, falta critério aos árbitros, mas estes esbarram na subjetividade que a regra lhes faculta em certas situações de jogo. Cada uma fará seu juízo de valor, obviamente alicerçado nas regras do jogo.

Porém, nunca teremos decisões unânimes nestes casos. Ao meu aviso, entendo que a presença da tecnologia pode auxiliar os árbitros na tomada de decisão. Principalmente em lances que não demandam interpretação. Ou seja, situações pontuais, como por exemplo, a bola que ultrapassa a linha de gol; Lembrando que o técnico e operador das imagens é um ser humano e também pode um dia falhar.

O tema é controverso e nem os experts no assunto chegam num consenso. Porém, o que me preocupa é a dimensão que se tem dado aos erros de arbitragem. Se buscarmos as estatísticas, seguramente, o índice de acertos é significativamente superior aos equívocos. Eles existem e vão continuar a existir, até porque, o futebol não é uma ciência exata.

Em verdade, as diferenças entre o campo e a tecnologia evidenciam a dificuldade de quem tem a missão de apitar uma partida de futebol. E a nossa cultura de se preocupar em apontar os defeitos e ignorar as soluções, mantém as coisas como estão. Enquanto isso, os árbitros vão pra campo desafiar a paixão e a razão, sem o direito de se equivocar.