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“Senado Federal criou uma nova fonte para os bandidos”

O Estatuto do Desarmamento, em vigor desde 2003, ainda gera polêmica e opiniões controversas no Brasil. Em recente movimento nas redes sociais, grupos pedem que essas leis sejam revistas e há pelo menos três projetos em tramitação na Câmara dos Deputados sobre o tema. Para falar mais sobre o assunto, o Edição do Brasil conversou com Felippe Angeli, assessor para advocacy do Instituto Sou da Paz.

Quem pode ter porte no Brasil? E como é o processo para que essa pessoa esteja apta a possuir uma arma?
Existem duas situações: o porte, no qual permite-se deslocar livremente com esse armamento, e o registro de arma comum, para posse e manutenção em casa. O porte é autorizado a todos que passarem por uma avaliação criteriosa da Polícia Federal (PF), na qual se analisa a justificativa da pessoa. A compra também pode ser feita por qualquer pessoa, desde que cumpra os requisitos da lei.

Além disso, tem-se categorias específicas, como polícias, guardas municipais e agentes penitenciários, que não precisam passar por esse exame de necessidade da PF, pois possuem o porte concedido de forma mais automática. Recentemente, outros profissionais têm sido incluídos nesse rol: juízes e auditores da receita federal. Inclusive, um projeto que libera o porte para agentes de trânsito passou no Senado e segue para sanção presidencial.

Essa ampliação te preocupa?
Sim. Na verdade, não estou dizendo que a polícia não pode portar arma de fogo – isso é um instrumento de trabalho e eles tem treinamento contínuo -. O que me preocupa é a questão da capacitação. Por exemplo, não há nenhuma justificativa de ordem funcional ou administrativa que possa explicar o porquê dos profissionais de trânsito precisarem de um armamento. Além disso, pesquisas mostram que a maior parte das armas utilizadas no crime são desviadas de instituições legais, como polícias ou seguranças privados. Essas companhias de engenharia de tráfego, no geral, são municipais e não tem a menor condição de cuidar dos arsenais. Estamos falando de mais armas que vão cair necessariamente nas mãos de criminosos. O Senado Federal criou uma nova fonte para os bandidos. Nem a própria polícia, que tem toda a orientação e profissionalização quanto a isso, consegue garantir a segurança de suas armas.

Podemos afirmar que a sociedade brasileira não está pronta para ter porte de arma?
Não acho que é uma questão de estar pronto. Existe um consenso científico internacional de que o aumento de circulação de armas de fogo tem um impacto significativo na violência letal. Em qualquer país que tiver uma movimentação mais abundante, vai ter esse problema. Muito se fala dos EUA, onde as pessoas são superarmadas e alguns acreditam que lá não se tem o problema de segurança pública. De fato, isso é um pouco menor do que no Brasil, mas estamos falando do país mais rico do mundo, onde há cidades como Baltimore, Detroit e New Orleans que possuem índices de criminalidades maiores do que no Rio de Janeiro. E se comparar os EUA com outras nações desenvolvidas, como Inglaterra, Japão e Alemanha, o índice de violência lá é bem superior aos demais.

Falando dos EUA, lá é comum acontecer vários atentados como o que ocorreu em Las Vegas. Se liberar o porte de armas no Brasil, isso também poderia acontecer aqui?
Aumenta o risco. Nos EUA, vai a uma loja e pode sair com um armamento de guerra. Se tiver um acesso tão facilitado, a chance de que um lunático coloque as mãos em armas cresce. O Brasil já tem um problema muito grande de segurança pública e que deve ser tratado de acordo com a nossa realidade.

O Estatuto do Desarmamento diminuiu o número de armas no país?
É difícil estabelecer isso, porque uma arma de fogo, tendo uma boa manutenção, dura de 30 a 40 anos. O que teve, no princípio, foi um diminuição no comércio, mas as vendas vem aumentando nos últimos anos. O fato mais importante que o estatuto trouxe foi a impossibilidade das pessoas andarem armada nas ruas e isso contribuiu com uma queda no aumento de homicídios: antes do estatuto, os assassinatos cresciam 8% ao ano e, hoje, essa média é de 1,2%.

Atualmente há uma pressão popular para que o estatuto seja revisto. Qual a sua opinião sobre isso?
Na verdade, se pegar a pesquisa mais recente do DataFolha, a maior parte da população é contrária a possibilidade do porte de arma. O fato é que há grupos barulhentos, principalmente nas redes sociais, que tentam apontar que existe um desejo social para o que o estatuto seja revogado. Eles promovem uma grande desinformação para divulgar as duas políticas